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CINEMA/ESTRÉIA
"PSICOPATA AMERICANO"
Cineasta Mary Harron fala sobre polêmico filme baseado no famoso livro pop de Bret Easton Ellis
Não gosto de violência; nem vi "Hannibal"
LÚCIO RIBEIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
Agora vai. Quase um ano depois
de estrear nos Estados Unidos, o
polêmico "Psicopata Americano"
finalmente chega ao cartaz no
Brasil, fazendo duplinha sanguinária com "Hannibal", outro que
estréia hoje.
Versão cinema do estupendamente violento livro do escritor
pop Bret Easton Ellis, lançado em
1991, "Psicopata Americano" é
um ácido retrato de época.
Livro e filme mapeiam a desalmada geração yuppie dos anos 80,
ao olhar de um personagem típico, um sujeito que de dia ganha os
tubos trabalhando na bolsa de valores e à noite, para se divertir, frequenta restaurantes da moda, exibe seu terno Armani para os amigos e trucida pessoas, fatiando-as
e as guardando na geladeira.
O livro de Ellis caiu nas câmeras
da feminista diretora canadense
Mary Harron, que estreou em
1996 com "Um Tiro para Andy
Warhol" ("I Shot Andy Warhol").
Como a carnificina "Psicopata
Americano", com uma história
machista e de uma época machista e fútil, foi parar nas mãos de
uma cineasta mulher e ainda por
cima feminista?
Mary Harron, por e-mail, explicou à Folha.
Folha - O que a atraiu para a missão de transformar em cinema o
polêmico livro de Bret Easton Ellis?
Mary Harron - Primeiro pela sátira social. Acho que Ellis capturou
a loucura do final dos anos 80 de
um jeito que ninguém conseguiu.
O livro é repleto de diálogos brilhantes e de observações sociais
perfeitas. Ele é excelente também
em descrever estados de ansiedade, da paranóia à desintegração.
Não acho o livro tão violento. E
olha que tenho estômago fraco
para violência. Não fui ver "Hannibal", por exemplo. Parece-me
muito sanguinário!
A violência não me atrai, mas ao
mesmo tempo senti que o filme
precisava ter alguns elementos
violentos, caso contrário não representaria decentemente o livro.
Folha - Quando você foi convidada para dirigir "Psicopata Americano", já havia lido o livro ou foi lê-lo
depois do convite?
Harron - Li em 1991, assim que
foi lançado em Londres. Acho que
ele foi subestimado. Muitos críticos ignoraram o propósito satírico da obra. O livro estava tentando dizer coisas sérias sobre a demência de uma sociedade obcecada com aparências superficiais.
Sabia que o filme ia herdar o lado
ruim da controvérsia do livro.
Folha - Como uma feminista que
dirige filmes, você tem um prazer
especial com "Psicopata Americano" e o jeito que o livro/filme satiriza o comportamento do homem
americano da geração que tinha à
época uns 20, 30 e poucos anos?
Harron - É claro. Uma das coisas
que me atraíram para o livro foi o
jeito como Ellis expôs essa altamente privilegiada elite americana, um grupo de jovens extremamente ricos que foram treinados
desde o berço para a cruel competição do sucesso a qualquer preço.
Divertiu ver o quanto era fútil e
inseguro o macho americano prepotente da época, que agia igual à
imagem estereotipada das garotas
adolescentes, obcecadas com roupas, corpo e status.
Folha - "Psicopata Americano" é
retrato dos 80 e mostra o universo
yuppie, dos jovens desalmados
com altos cargos em firmas grandes, na bolsa de valores. Você vê o
filme como registro de uma época
distante, datada, ou acha que há
reminiscências do período na atual
era "ponto.com"?
Harron - Sempre achei que o filme deveria fincar pé nos 80 porque era essa a época a ser satirizada. Muitos dos detalhes maravilhosos do livro sobre restaurantes,
consumo, a cultura lobotomizada
pertencem tanto aos 80...
Acho que em algumas coisas os
80 parecem com a época atual,
mas não na essência. No passado
havia uma óbvia celebração da riqueza e do egoísmo, enquanto
que nesta era "ponto.com" as pessoas que ganharam dinheiro são
mais generosas, liberais, de estilo
simples. Até pode existir um Bateman hoje, mas de uma forma ou
de outra ele acaba expelido pelo
meio. Pelo menos é o que acho.
Folha - Tanto quanto o livro pendia para a violência, o filme vai
mais para um lado de diversão. Você vê assim?
Harron - Espero que as pessoas
vejam assim. Foi minha intenção
quando pensei no filme pela primeira vez. É um filme difícil de se
classificar. Eu mesma não sei.
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