Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CINEMA/ESTRÉIA
"AMOR À FLOR DA PELE"
Premiado no Festival de Cannes no ano passado, Wong Kar-wai fala sobre uma época perdida
Diretor investiga faces da mesma moeda
LÚCIA RODRIGUES
DA REDAÇÃO
Ele, um executivo. Ela, uma dona-de-casa ciosa de seus deveres.
Os dois se conhecem num apartamento da Hong Kong dos anos
60. Aos poucos, ambos se descobrem traídos: ele pelo marido dela, ela pela mulher dele.
Passam a se encontrar para tentar entender onde erraram. Até
que se apaixonam. "Eles entendem que poderia ter ocorrido
exatamente o mesmo com eles. É
como dois lados de uma moeda",
disse o diretor, Wong Kar-wai, 53.
"Amor à Flor da Pele" estréia
hoje após ter sido premiado no
Festival de Cannes (melhor ator
para Tony Leung e Grande Prêmio da Comissão Superior Técnica) e, na última terça-feira, perder
a indicação ao Oscar de melhor
filme estrangeiro. Leia trechos da
entrevista do diretor por e-mail.
Folha - Em "Amor à Flor da Pele",
o sr. utiliza muitas referências latino-americanas. Qual a sua relação
com a música latina? Por que o sr.
escolheu usar boleros?
Wong Kar-wai - Eu escolhi tipos
de música que me atraem, e eles
podem ser de diversos estilos. Eu
me lembro de crescer envolto por
música latina. Tentei capturar o
som da época do filme.
Folha - No filme, seus personagens sempre usam um tipo peculiar
de roupa. Por quê?
Kar-wai - Eles usam o que estava
na moda naquele período -a
Hong Kong da década de 60.
Além disso, tem algo de tradicional no que a protagonista (Maggie
Cheung) veste no filme -era o
que todas as garotas de Xangai
usavam naquela época. É o tradicional "qipao" (vestido oriental,
justo, com gola Mao, que cobre
todo o pescoço). Deriva dos vestidos usados na corte da dinastia
Qing.
Folha - Às vezes, seu filme parece
um videoclipe, às vezes, somente
preocupado com a fotografia...
Kar-wai - Diferentes cenas requerem diferentes propostas, tanto artística quanto tecnicamente.
Folha - Como definiria o filme?
Kar-wai - Acho que é sobre memória e toda uma era perdida.
Folha - Seu filme não mostra nenhum dos outros personagens fora
a dupla traída, que acaba se apaixonando. Por que o sr. escolheu a
elipse como forma de linguagem?
Kar-wai - O filme não é uma história sobre quatro pessoas apenas. Não fala sobre moral, casos
amorosos ou casamento. Ele trata
de duas pessoas, que parecem ser
vítimas de seus casamentos e foram traídas por seus parceiros.
Eles ensaiam para tentar entender
como o romance entre o marido
dela e a mulher dele começou. Finalmente, quando descobrem o
que houve, entendem que poderia ter ocorrido exatamente o
mesmo com eles. É como dois lados da mesma moeda.
Folha - "Amor à Flor da Pele" chega aos cinemas brasileiros pouco
depois das indicações ao Oscar. O
que o sr. acha da Academia?
Kar-wai - Hollywood é tudo o
que vem à minha mente.
Folha - O sr. tem algum projeto
em mente ou em andamento?
Kar-wai - Eu estou no meio das
filmagens de "2046", que vai tratar do mundo daqui a 45 anos.
Folha - O sr. conhece o Brasil?
Kar-wai - Quando estávamos filmando "Felizes Juntos" (98) na
Argentina, cruzamos a fronteira
para o Brasil. Minha impressão é
que ele é muito contrastante com
a Argentina. O Brasil é ensolarado
e cheio de cores, enquanto a Argentina tende a ser cinzenta.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Crítica: Fruto do desencanto Índice
|