São Paulo, sexta-feira, 23 de fevereiro de 2001

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CINEMA/ESTRÉIA

"AMOR À FLOR DA PELE"

Premiado no Festival de Cannes no ano passado, Wong Kar-wai fala sobre uma época perdida

Diretor investiga faces da mesma moeda


LÚCIA RODRIGUES
DA REDAÇÃO

Ele, um executivo. Ela, uma dona-de-casa ciosa de seus deveres. Os dois se conhecem num apartamento da Hong Kong dos anos 60. Aos poucos, ambos se descobrem traídos: ele pelo marido dela, ela pela mulher dele.
Passam a se encontrar para tentar entender onde erraram. Até que se apaixonam. "Eles entendem que poderia ter ocorrido exatamente o mesmo com eles. É como dois lados de uma moeda", disse o diretor, Wong Kar-wai, 53.
"Amor à Flor da Pele" estréia hoje após ter sido premiado no Festival de Cannes (melhor ator para Tony Leung e Grande Prêmio da Comissão Superior Técnica) e, na última terça-feira, perder a indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Leia trechos da entrevista do diretor por e-mail.

Folha - Em "Amor à Flor da Pele", o sr. utiliza muitas referências latino-americanas. Qual a sua relação com a música latina? Por que o sr. escolheu usar boleros?
Wong Kar-wai -
Eu escolhi tipos de música que me atraem, e eles podem ser de diversos estilos. Eu me lembro de crescer envolto por música latina. Tentei capturar o som da época do filme.

Folha - No filme, seus personagens sempre usam um tipo peculiar de roupa. Por quê?
Kar-wai -
Eles usam o que estava na moda naquele período -a Hong Kong da década de 60. Além disso, tem algo de tradicional no que a protagonista (Maggie Cheung) veste no filme -era o que todas as garotas de Xangai usavam naquela época. É o tradicional "qipao" (vestido oriental, justo, com gola Mao, que cobre todo o pescoço). Deriva dos vestidos usados na corte da dinastia Qing.

Folha - Às vezes, seu filme parece um videoclipe, às vezes, somente preocupado com a fotografia...
Kar-wai -
Diferentes cenas requerem diferentes propostas, tanto artística quanto tecnicamente.

Folha - Como definiria o filme?
Kar-wai -
Acho que é sobre memória e toda uma era perdida.

Folha - Seu filme não mostra nenhum dos outros personagens fora a dupla traída, que acaba se apaixonando. Por que o sr. escolheu a elipse como forma de linguagem?
Kar-wai -
O filme não é uma história sobre quatro pessoas apenas. Não fala sobre moral, casos amorosos ou casamento. Ele trata de duas pessoas, que parecem ser vítimas de seus casamentos e foram traídas por seus parceiros. Eles ensaiam para tentar entender como o romance entre o marido dela e a mulher dele começou. Finalmente, quando descobrem o que houve, entendem que poderia ter ocorrido exatamente o mesmo com eles. É como dois lados da mesma moeda.

Folha - "Amor à Flor da Pele" chega aos cinemas brasileiros pouco depois das indicações ao Oscar. O que o sr. acha da Academia?
Kar-wai -
Hollywood é tudo o que vem à minha mente.

Folha - O sr. tem algum projeto em mente ou em andamento?
Kar-wai -
Eu estou no meio das filmagens de "2046", que vai tratar do mundo daqui a 45 anos.

Folha - O sr. conhece o Brasil?
Kar-wai -
Quando estávamos filmando "Felizes Juntos" (98) na Argentina, cruzamos a fronteira para o Brasil. Minha impressão é que ele é muito contrastante com a Argentina. O Brasil é ensolarado e cheio de cores, enquanto a Argentina tende a ser cinzenta.


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