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"Dança é arquitetura em movimento"
especial para a Folha, em Paris
"Faço uma espécie de Torre de
Babel ao contrário. Em vez da maldição bíblica, a diversidade de linguagens representa um canal de
integração em meus espetáculos",
diz José Montalvo. Leia a seguir
sua entrevista à Folha.
(AFP)
Folha - Como você chegou à dança?
José Montalvo - No começo eu
praticava dança simplesmente por
divertimento e prazer. Para mim e
meus amigos a dança tinha uma
dimensão sensual, pois representava o ambiente onde havia mais
mulheres por metro quadrado.
Essa mentalidade mudou quando conheci Jerome Andrews, um
pedagogo excepcional, que tinha
um conhecimento polifônico da
dança. Andrews morreu em 1994 e
ao longo de sua carreira ele tanto
dançou com Maurice Chevalier
quanto trabalhou com precursoras
da dança moderna, como Mary
Wigman e Martha Graham.
Eu tinha formação em arquitetura e artes plásticas e Andrews me
fez compreender a relação da dança com essas disciplinas. Resolvi
fazer da dança minha profissão ao
perceber que ela é arquitetura em
movimento, com uma dimensão
efêmera e sensual particular.
Folha - No Centro Coreográfico
de Créteil, onde seu grupo está sediado, você desenvolve uma atividade aberta à comunidade. Quais
são as diretrizes desse trabalho?
Montalvo - Meu trabalho se
constrói em torno de dois eixos.
Trata-se de um trabalho de criação, mas também de uma atividade que permite ao público se apropriar da arte.
Entre pessoas que praticam dança sem interesse profissional, procuro despertar a percepção da
dança como arte de viver, como
maneira de surpreender a si mesmo e reencontrar o prazer imemorial de dançar.
Para obter resultados, coloco
proposições simples e estranhas ao
mesmo tempo. As propostas devem ser simples para que pessoas
de todas as condições físicas tenham acesso, para que cada um
aceite sua própria corporalidade,
aprenda a lidar com ela, reinventando sua própria expressão.
Ao mesmo tempo, tais proposições causam estranheza porque
criam relações com a modernidade. Esse trabalho de via dupla me
permite refletir sobre o papel do
artista na sociedade e o que ele pode trazer para a vida cotidiana.
Folha - No momento atual da
França, com a direita procurando
acirrar os preconceitos contra imigrantes, você acha que seu trabalho assume um papel político?
Montalvo - Não diretamente. No
entanto, a dimensão política acaba
aflorando à medida que minhas
obras contrariam a xenofobia, por
meio de um cosmopolitismo cuja
riqueza eu tento realçar.
Meu trabalho não tem pretensões políticas. Apenas procuro
mostrar, com desenvoltura e elegância, que a interação de culturas
diferentes e o contato com a diversidade permitem alargar nosso
imaginário, trazendo-nos o júbilo
estético.
Folha - Qual o sentido da tecnologia em seus espetáculos que,
além de misturar vários estilos de
dança, também incluem imagens
virtuais se fundindo à ação real?
Montalvo - Hoje as pessoas são
capazes de descartar o espetáculo
vivo para ficar em casa à frente de
uma televisão que lhes fornece dezenas de canais diferentes.
Perante tal realidade, procuro
usar a tecnologia como uma espécie de vacina. Ou seja, injeto o mal
para atenuar ou eliminar o mal. Ao
me apropriar da imagem virtual
procuro colocar a tecnologia a serviço do espetáculo vivo, criando
uma interação poética.
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