São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2001

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Tempo atravessa todos os textos

ESPECIAL PARA A FOLHA

Beckett escreveu "Dias Felizes", "Jogo" e "Ir e Vir" entre 1961 e 1965. A questão do tempo, na ficção e na vida, atravessa os três textos. Nos 80 minutos de "Dias Felizes", o andamento é mais solto e imita o tempo natural. Em "Ir e Vir", cena circular de sete minutos e meio, os momentos arrastam-se. Em "Jogo", que apresenta triângulo amoroso em pouco mais de 20 minutos, o tempo se acelera de maneira tragicômica.
As três mulheres de "Ir e Vir" contam umas às outras segredos que o público não chega a captar. Sóbrias, hieráticas, lembram as tias de "Dorotéia", peça de Nelson Rodrigues. Os segredos, presumivelmente de caráter sexual, fazem as figuras quebrarem o silêncio com gritos de susto.
Em "Jogo", os atores pronunciam, em andamento rapidíssimo, frases carregadas de pequenas mesquinharias, típicas das situações de adultério. A luz incide alternadamente sobre os personagens em ritmo oligofrênico e preciso. As criaturas ouvem pouco umas às outras e, no limite, não escutam a si próprias.
As três peças, encenadas com rigor geométrico e requinte visual, tematizam os limites impostos aos personagens. A linguagem e a própria psicologia dos personagens mostram-se essenciais, lapidares. As figuras de Beckett parecem pueris, incapazes de dominar ou, até, de entender o mundo à volta. Vale lembrar que Beckett se deixou influenciar pelo music-hall e pelas farsas do cinema mudo, espécie de comicidade a que soube emprestar tons de tragédia.


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