São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2001

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10º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA

MOSTRA OFICIAL

"Dias Felizes", "Ir e Vir" e "Jogo", do autor irlandês, integram programação do Felizes para Sempre, de Brasília

Projeto apresenta três textos de Beckett

FERNANDO MARQUES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em "Dias Felizes", peça do irlandês Samuel Beckett, a madura Winnie gasta as horas em tarefas triviais, mas é como se praticasse os atos mais transcendentes. Limitada pelas paredes de casa e acompanhada do marido, o monossilábico Willie, a personagem dedica-se a decifrar o que diz a legenda na escova de dentes ou tenta encontrar prazer em pentear-se. Humor e drama se condensam em gestos prosaicos, no que se pode chamar de metafísica do dia-a-dia. A patética Winnie, afinal, se parece com todo mundo.
O espetáculo, com Vera Holtz e William Ferreira, sob a direção de Adriano e Fernando Guimarães, integra o projeto Felizes para Sempre, de Brasília. O projeto reúne ainda dois outros textos de Beckett, "Ir e Vir" e "Jogo", estes traduzidos sob encomenda por Barbara Heliodora.
Instalação plástica e performances também fazem parte de Felizes para Sempre, que se desdobra em dois espetáculos a serem vistos na Mostra Oficial do 10º Festival de Teatro de Curitiba (FTC). "Dias Felizes" estréia hoje, no Solar do Barão. No mesmo local, a partir do dia 30, aparecem "Ir e Vir" e "Jogo".
Adriano e Fernando Guimarães recorreram a Heliodora, tradutora reconhecidamente competente, por entender que a enganosa simplicidade de Beckett exige atenção aos jogos de linguagem, nas "falas descarnadas até o essencial", segundo explicam.
Antes de assistir a "Dias Felizes", os espectadores visitam exposição com armários nos quais estão guardadas velhas fotos de família ou câmeras de vídeo que invertem os esquemas habituais de contemplação: o público vê ao mesmo tempo em que é visto. "As coisas têm vida própria", dizem os irmãos Guimarães, referindo-se às "situações alheias à vontade dos personagens" e à incontornável passagem do tempo, temas comuns a exposição e espetáculos.
Vera Holtz conta que "o sistema emocional complexo" proposto por Beckett foi traduzido por diretores e atores no sentido da "identificação imediata". Os esforços da ingênua e solitária Winnie para preencher seus dias miúdos podem corresponder a "qualquer tipo de solidão".
A intenção foi trazer Beckett das alturas metafísicas para a vida cotidiana: trata-se da "metafísica que está na vida", diz Holtz. As grandes questões existenciais do amor e da morte comprimem-se nas esperanças singelas de Winnie: "Que dia feliz este também terá sido, mais um, apesar de tudo até agora", contenta-se a personagem, em fala citada pela intérprete.
Os trabalhos reunidos no projeto Felizes para Sempre já foram mostrados no Rio, no ano passado, e em Brasília, em janeiro e fevereiro deste ano (a primeira versão do projeto data de 1998).
Duas performances inéditas, com os atores Alessandro Brandão e Míriam Virna, estão previstas para o festival em Curitiba. A temporada realiza-se no Solar do Barão, de meados do século 19.



Projeto: Felizes para Sempre
Concepção e direção: Adriano e Fernando Guimarães
Quando: "Dias Felizes", dia 23, às 21h30, dias 24 e 25, às 20h; "Ir e Vir" e "Jogo", dia 30, às 21h30, dias 31 e 1º de abril, às 20h Onde: Solar do Barão (r. Carlos Cavalcanti, 533)
Patrocinadores: Brasil Telecom e Centro Cultural Banco do Brasil




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