São Paulo, segunda, 23 de março de 1998

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18º SALÃO DO LIVRO
Em Paris, músico e agricultor escritores, tímidos, tentam "despistar" público e mediadores
Chico e Raduan não dialogam com platéia

LUIZ ANTÔNIO RYFF
enviado especial a Paris

Um jogo de gato e rato entre, de um lado, público e mediadores franceses e, de outro, um músico e um agricultor que escrevem, reconhecidamente tímidos e avessos a perguntadores profissionais (imprensa) e amadores (público).
Dessa forma podem ser definidos os encontros que Chico Buarque e Raduan Nassar tiveram com a platéia em Paris, durante o 18º Salão do Livro.
Os dois -que no ano passado participaram de leituras conjuntas das próprias obras- foram as atrações de duas mesas de debates. Na primeira, dividiram atenções com outra escritora que não costuma falar muito: Patrícia Mello, mas que, pelo menos no debate, fez uma exceção, tornando as vidas de Raduan e Chico mais fáceis.
O mediador, o jornalista Frederic Pagès, tentou "dificultar", perguntando se Chico gostava de ler jornais, se Raduan gostava de ver TV, ou se havia diferença entre literatura popular e erudita.
"Sinto decepcioná-lo, mas não me preocupo com isso", respondeu Raduan, que pediu desculpas ao público por não se interessar por "especulações teóricas".
Pagès insistia. Enquanto questionava se estava havia uma desvalorização da escrita com o desenvolvimento das imagens, Raduan balançava negativamente a cabeça cobrindo o rosto com a mão.
Tanto ele quanto Chico, tentavam minimizar a aura de demiurgo do escritor. "Sou a favor da inutilidade da obra literária. Mas quando você faz um livro, as pessoas perguntam se vai virar filme. Como se só assim fosse virar algo real", ironizou.
Chico refuta o status de poeta por suas letras, não considera suas canções como literatura e acredita que essa separação também é feita pelas pessoas. E que é visto como um cantor que escreve -revelou sua surpresa quando o enredo da Mangueira em sua homenagem não citou sua atividade literária.
Raduan, por sua vez, confessou ter "três pés atrás" com relação aos meios literários. "Tenho um pouco de dificuldade de conviver com o pedantismo. Escrever é uma atividade superestimada. Podiam me tomar por uma pessoa pretensiosa", afirmou ele.
Para a platéia, que espera revelações íntimas, os encontros devem ter sido frustrantes. Raduan tentava escapar das perguntas. "Não tenho muito serviço a mostrar. Estava achando mais interessante a conversa com Chico."
Após a leitura de trechos de seus livros, perguntaram a Raduan se ele acreditava em Deus. "Posso responder no próximo salão do livro?", riu, se despedindo.



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