São Paulo, terça, 23 de março de 1999
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OSCAR
Diretor afirma que campanha da Miramax surtiu efeito, mas não há nada que a impeça de agir agressivamente
Foi uma vitória de marketing, diz Salles

CLAUDIO CASTILHO
especial para a Folha, em Los Angeles

A falta de uma vitória brasileira na cerimônia do Oscar, realizada anteontem, em Los Angeles, não desanimou a equipe de "Central do Brasil", que ficou até o começo da madrugada na festa oficial do evento, Governor's Ball. "Ficamos juntos o tempo inteiro, solidários um com o outro e conscientes de que há de haver sempre humildade tanto na vitória quanto na derrota", disse o diretor Walter Salles à Folha logo após o término da cerimônia. Leia a entrevista.

Folha - Você já desconfiava da vitória de "A Vida É Bela"?
Walter Salles -
Temos que aplaudir Roberto Benigni por ter conseguido ultrapassar o gueto do filme estrangeiro. A campanha milionária da Miramax acabou surtindo efeito não somente ao ajudar na imagem de Benigni, que se transformou num verdadeiro fenômeno de massa nos EUA, como também em todas as categorias.
Fico surpreso que filmes como "Além da Linha Vermelha" e "O Resgate do Soldado Ryan" tenham perdido de uma produção como "Shakespeare Apaixonado". Foi uma vitória de marketing quantitativa. Vemos mais uma vez a máquina extremamente azeitada da Miramax surtindo efeito. E não há nada que proíba estúdio algum de agir com tamanha agressividade.
Folha - Você vê solução para esse tipo de desigualdade de forças?
Salles -
Como "O Resgate do Soldado Ryan" saiu perdendo, quem sabe Spielberg e outros nomes de peso da indústria comecem a pensar a mudar o sistema. No caso de "Central", acredito que, mesmo se a Sony Pictures investisse 20 vezes mais do que gastou em marketing do filme, o resultado continuaria sendo o mesmo. Isso em função de Benigni ter se tornado um fenômeno de exportação nos EUA.
Folha - O que mais o entristece com os resultados desse Oscar?
Salles -
Lamento o fato de o talento magnífico de Fernanda Montenegro não ter sido reconhecido. Mas Fernanda é uma pessoa incrível e reagiu com a tranquilidade e a elegância que lhe são comuns.
Folha - Qual foi o momento da festa que mais o agradou?
Salles -
O ponto alto da festa foi a homenagem que fizeram a Kubrick. Já a homenagem a Elia Kazan foi um absurdo. Não consegui ficar no teatro e, ao lado de umas 300 pessoas, fui para fora.
Folha - Poderia citar um exemplo do que tenha sido óbvio na noite?
Salles -
A derrota de "Central do Brasil" é um exemplo. Quando Sophia Loren foi apontada quatro dias antes para apresentar o prêmio na categoria, passei a não ter mais dúvidas da vitória de "A Vida É Bela". Sabia que as cartas estavam marcadas e que os critérios de escolha eram decodificáveis.
Folha - Valeu a pena chegar até o fim dessa estrada?
Salles -
Lógico. Foram 14 meses de muito trabalho. Percorremos vários lugares falando do filme e do cinema nacional. Gostaria de agradecer a todos os que nos apoiaram e fico feliz com essa trajetória. Para mim, afetivamente o ciclo de "Central" se fechou semana passada em Vitória da Conquista, um dos locais de gravação do filme. Nosso filme saiu da Central do Brasil em busca do impossível centro do Brasil. Ao retornar a essa locação eu tive a sensação de que a viagem tinha se encerrado. O Oscar aconteceu depois de o tempo regulamentar ter se esgotado.
Folha - Quais são seus planos?
Salles -
Vou ficar mais uma semana nos EUA para, ao lado de Arthur Cohn, tentar fechar futuros projetos. Temos quatro em vista, alguns roteiros escritos e outros em desenvolvimento, mas nada ainda definido. Talvez venhamos a acertar uma colaboração da produtora de Robert Redford.


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