São Paulo, terça, 23 de março de 1999
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ANÁLISE
O ano Miramax

AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas

Hollywood piscou. O Oscar 99 lembra o de 81. A surpreendente e merecida vitória de "Shakespeare Apaixonado" remete ao triunfo de "Carruagens de Fogo", outro projeto britânico a se impor sobre a produção americana.
Várias tradições da Academia foram rompidas. A mais marcante é o raro triunfo do humor, seja pelo domínio da premiação por "Shakespeare", ou pelos incríveis três prêmios a "A Vida É Bela".
O feito mais impressionante foi o prêmio de ator para Roberto Benigni. Ele tornou-se o primeiro homem a levar a estatueta interpretando em outra língua que não o inglês.
Também incomum foi a falta de sintonia entre as duas categorias principais, ocorrida apenas 17 vezes nas 70 edições anteriores do Oscar.
O cinema americano venceu naquilo em que é indiscutivelmente superior: técnica. Basta ver os prêmios para "O Resgate do Soldado Ryan".
O "ano do Oscar globalizado" acabou tornando-se o "ano Miramax", com os dez prêmios arrebatados por "Shakespeare" e "A Vida É Bela". O ataque à ofensiva publicitária dos irmãos Weinstein deve crescer. Se apenas exploraram, com competência e bolsos profundos, as velhas regras do jogo, a onda murcha. Caso se prove que recursos ilícitos de convencimento foram usados, a subsidiária da Disney pode apagar amanhã o Oscar de hoje.
No caminho dos Oscar de "Central" havia a Miramax. Nas duas categorias que disputou, o filme foi superado por longas da distribuidora.
Adotada como musa pela Miramax, Gwyneth Paltrow é uma estrela em ascensão que soube explorar as potencialidades de seu papel em "Shakespeare". Fernanda Montenegro já fizera história ao ser indicada. Se vencesse, teria feito milagre.
O provincianismo americano reafirmou-se com o descaso na apresentação dos concorrentes a filme estrangeiro, relegados a brevíssimos trechos exibidos numa telinha. A exceção foi a estranha projeção imediatamente anterior do clipe de "A Vida É Bela" como indicado também na categoria principal.
A escolha de Sophia Loren para apresentá-lo e depois entregar o prêmio para o melhor filme estrangeiro vai alimentar teorias contra a lisura da decisão. Podem argumentar que o favoritismo de Benigni era evidente, mas soou suspeito.
Duas surpresas fizeram justiça. O veterano James Coburn recebeu reconhecimento por seu corajoso papel em "Temporada de Caça". Por sua vez, o prêmio de roteiro adaptado para Bill Condon aplaude sua sensível incursão na história da homofobia da Hollywood clássica com "Deuses e Monstros".
Nada, contudo, superou o desconforto da entrega do Oscar especial a Elia Kazan, 90. O boicote de aplausos não vingou, mas tampouco Kazan recebeu a recepção consagradora de praxe. Apesar do apoio de Martin Scorsese e Robert De Niro, o mal-estar no palco foi até maior que na platéia. Foi o isolado instante memorável de toda a cerimônia.


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