São Paulo, terça, 23 de março de 1999
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CRÍTICA
Cerimônia foi chocha

BIA ABRAMO
especial para a Folha

E os perdedores foram todos os que ficaram acordados até mais de 2h, vendo uma das cerimônias de entrega de Oscar mais chatas e chochas dos últimos tempos.
A dupla Renato Machado e Wilson Cunha, respectivamente apresentador e comentarista da Rede Globo, pouco fez para espantar o sono do espectador. Comentarista, aliás, modo de dizer, porque Cunha manifestou-se raramente e quando o fez, soltou coisas do tipo "a vida pode ser bela apesar de Roberto Benigni", contra quem torceu o tempo todo de forma explícita e sem o menor pejo.
Não mereceu nem ao menos um muxoxo a deslocadíssima aparição do general Colin Powell -para apresentar "O Resgate do Soldado Ryan" e "Além da Linha Vermelha"-, como se um militar na vida real conferisse mais "verdade" à visão de Hollywood sobre a guerra.
A outra personalidade extracinematográfica, o astronauta John Glenn, lançou um daqueles clipões na homenagem a personagens reais do cinema, "heróis da humanidade", segundo a visão da indústria cinematográfica, um balaio onde cabiam gatos como Ghandi e Oskar Schindler. Necas de comentário, também.
A estratégia da Globo de esquentar a transmissão, com câmeras em Cruzeiro do Nordeste e em um telão no Rio de Janeiro, onde estava reunida parte da equipe de "Central do Brasil" não funcionou. Espremidas entre anúncios e a transmissão de Los Angeles, as imagens da "torcida" só apareceram por três vezes e por pouquíssimos segundos.
A Globo entrou como uma coadjuvante canhestra, mas o prêmio máximo de chatice vai mesmo para a entrega dos prêmios em si.
Whoopi Goldberg até que tentou dar algum molho, vestindo-se a caráter para cada concorrente a melhor figurino e soltando algumas boas piadas, mas a festa septuagenária precisa urgentemente de uma reengenharia.
Este ano, parecia tudo requentado: os discursos, as homenagens, até as roupas. O único momento de algum frisson foi o da homenagem polêmica a Elia Kazan, quando parte da platéia não se levantou ou não aplaudiu, por conta do passado de colaboração com o macarthismo do diretor.
Nem mesmo as câmeras da transmissão norte-americana ajudaram: insistiam em meia dúzia de astros e estrelas. Alguns compreensíveis pela importância, probabilidade de ganhar uma estatueta ou por glamour -Steven Spielberg, Tom Hanks, Cate Blanchett. E outros, que não se sabe por que apareceram tanto, como Geoffrey Rush, que, apesar de ter sido um dos primeiros perdedores (não levou o prêmio de ator coadjuvante) e não ser assim um primor de beleza, era constantemente focalizado.
Na verdade, talvez não tenha sido só a festa que perdeu o interesse. Talvez Hollywood não esteja conseguindo mais criar mitos e mitologias nas quais valha a pena acreditar. E daí não há piada nem figurino que segure.


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