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OSCAR
Na ressaca da não-premiação de "Central do Brasil" pela Academia, produtores discutem futuro da atividade
Sem estatueta, cinema nacional "cai na real"
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
A "derrota" de "Central do Brasil"
na disputa do Oscar foi recebida
com uma frustração moderada pelo meio cinematográfico nacional.
Aparentemente, ninguém depositava demasiadas esperanças na
premiação do filme e da atriz Fernanda Montenegro.
"Claro que, se o filme ganhasse,
isso traria mais ânimo para a classe
cinematográfica e para o conjunto
da sociedade brasileira e talvez levasse instituições hoje hesitantes a
investir dinheiro em filmes", diz o
produtor Francisco Ramalho, habitual parceiro de Hector Babenco.
"Mas não foi uma derrota", ressalva Ramalho, fazendo coro com
outros produtores e distribuidores
ouvidos pela Folha.
"Mesmo sem o Oscar, "Central" é
um grande vencedor, pois, além
das premiações e do prestígio internacional, ele conquistou o mais
importante: diminuiu a desconfiança do espectador brasileiro
com relação ao cinema feito no
país", avalia o crítico José Carlos
Avelar, diretor da distribuidora
Riofilme, a única especializada em
produções brasileiras.
Na avaliação de Adhemar de Oliveira, diretor do Espaço Unibanco
de Cinema de São Paulo, a derrota
não foi traumática, "porque deu
para perceber que o Oscar é, sobretudo, "business". "Antes de concorrer, o filme já tinha caído nas graças do público."
O produtor Roberto Farias diz
que a performance do filme "demonstra que, com instrumentos
equivalentes a um canivete, o cinema brasileiro consegue competir
com o que os outros fazem com
uma bateria de computadores, capazes de levar o homem a Marte".
Segundo Farias, "Central" confirma a vocação brasileira para o audiovisual e derruba a idéia de que o
cinema brasileiro tem "dificuldade
de dialogar" com o público. "O que
é preciso é estabelecer elementos
de competição justa com o produto importado em nosso próprio
mercado."
"Cair na real"
Para a produtora Sara Silveira, o
"efeito "Central" está passando:
"Temos de cair na real. Com o sucesso do "Central", estávamos de
certa forma tapando o sol com a
peneira. É preciso ver que o cinema brasileiro enfrenta problemas
gravíssimos, sobretudo nas áreas
da distribuição e da exibição."
O produtor Aníbal Massaini Neto também acredita que a "ressaca"
do Oscar é um bom momento para
"fazer uma reflexão sobre a situação do nosso cinema". Segundo ele,
"o neoliberalismo está impedindo
o governo de exercer um papel regulador do mercado".
Para Massaini, o modelo de captação de recursos para a produção
de filmes tem de ser revisto. "No
atual mecanismo, que incentiva o
investimento com base na renúncia fiscal, a decisão sobre onde investir cabe a diretores de marketing das empresas. Um filme como
"A Vida É Bela" nunca seria produzido pela Lei do Audiovisual."
Farias concorda e dá como
exemplo o filme "Rota 66", de seu
filho Lui Faria, que tem dificuldade
em captar recursos devido a seu tema polêmico (violência policial).
Também o cineasta e produtor
Sylvio Back acredita que o atual
modelo dificulta a captação de recursos para filmes considerados
polêmicos ou incômodos. "O resultado disso é um cinema "chapa
branca", diz Back, utilizando, aliás,
a mesma expressão usada por Aníbal Massaini.
Recursos minguados
Independentemente do destino
dado aos recursos captados pelo
cinema, todos concordam que estes tendem a minguar no atual
contexto de recessão.
"A captação é feita com base no
lucro das empresas e esse lucro diminuiu muito com a atual crise",
afirma Francisco Ramalho, que
também defende uma mudança na
legislação para o setor audiovisual.
"O atual modelo já está dando sinais de desgaste há algum tempo."
Massaini acrescenta um dado
econômico para reforçar o argumento a favor da reforma da legislação. "Na área do audiovisual, estamos importando anualmente
mais de US$ 600 milhões e exportando apenas US$ 35 milhões, incluindo aí os programas da Rede
Globo. Será que não poderíamos
estar importando menos e exportando mais?"
Apesar do pessimismo, produtores e distribuidores concordam
que as indicações de "Central" para o Oscar ajudaram indiretamente o cinema nacional. "O fato de ser
indicado, além das vitórias no Globo de Ouro e em Berlim, reforçou a
relação do público com o filme
brasileiro em geral", diz Adhemar
de Oliveira.
"O Brasil já havia concorrido ao
Oscar outras vezes, mas senti que
desta vez, pelo fato de a atriz também ter sido indicada, o reconhecimento do nosso cinema foi ampliado", acrescenta Massaini.
Sara Silveira concorda: "Fernanda conquistou uma grande vitória
para os atores brasileiros, superando a barreira da língua".
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