São Paulo, terça, 23 de março de 1999
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FILME CRÍTICA
Clichês para rir e chorar

JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas

"Patch Adams", o novo filme estrelado por Robin Williams, defende uma idéia que, de tão óbvia, não precisa de muita defesa: os doentes devem ser tratados com muito carinho e pouca burocracia.
Como a "mensagem positiva" do filme não deixa muito o que discutir (quem é contra dar carinho e alegria aos pacientes?), o que resta é observar como o cinemão americano manipula sem pudor os sentimentos da platéia.
O personagem-título, Hunter "Patch" Adams (Williams), é um homem um tanto desajustado que, depois de tentar o suicídio e se internar por vontade própria num hospício, resolve se tornar médico para melhorar a qualidade de vida das pessoas enfermas.
Para encaixotar essa boa história no padrão "filme edificante para rir e chorar", o roteiro espalhou obstáculos no caminho do bom samaritano.
Na escola de medicina, o reitor malvado (Bob Gunton) quer podar seus métodos não-usuais de "cura pelo riso"; um colega invejoso (Philip Seymour Hoffman) o acusa de "colar" nas provas; a bonitinha da classe (Monica Potter) o despreza acintosamente; um paciente terminal (Peter Coyote) o trata como a um cachorro.
Com suas piadas infames, seu sorriso "cativante" (pelo menos a intenção é essa) e sua obstinação quase mística, Adams consegue vencer, uma por uma, todas as resistências, menos a do reitor vilão, que ele terá de derrotar no final apoteótico e catártico.
Embora "baseado numa história real", como diz o letreiro de abertura, o roteiro de "Patch Adams" parece produzido por um programa de computador ou por uma daquelas reuniões sinistras de executivos de estúdio, tão bem retratadas por Robert Altman em "O Jogador".

Clichês
Todos os clichês das comédias dramáticas americanas estão costurados no filme.
A começar pelos personagens: o idealista que luta contra o "sistema"; o velho maluco que, na verdade, é um gênio excêntrico (e milionário); o jovem egoísta que recebe uma "lição de vida" e aprende a ser solidário; a mocinha inacessível que aos poucos converte sua hostilidade em amor.
Tudo isso organizado em cenas e situações dramáticas igualmente infalíveis: a borboletinha colorida que sobrevoa o personagem à beira do abismo e o impede de se matar; o clímax no tribunal, onde o bem e o mal se defrontam num torneio de retórica sentimental.
Claro que a escolha do ator também não foi casual. Perguntaram ao computador: qual é o astro indicado para alternar caretas engraçadas e expressões de choro, contar piadas rápidas e inspirar piedade? A resposta não podia ser outra: Robin Williams.
O astro é a prova viva de que tudo, inclusive os atores, se transforma em fórmula previsível no cinema industrial. Claro que, aqui e ali, seu talento explode em pura e incontível energia cômica.
Algumas piadas -como a da porta da faculdade transformada numa imensa vagina- são memoráveis. À parte isso, o filme é de uma eficiência maquiavélica. Com seu sentimentalismo pegajoso, vai fazer o maior sucesso.


Filme: Patch Adams - O Amor É Contagioso Produção: EUA, 1998 Direção: Tom Shadyac Com: Robin Williams, Daniel London, Monica Potter, Bob Gunton Onde: em São Paulo, no SP Market 3, Interlar Aricanduva 12, Center Norte 2, Paulista 3, West Plaza 2 e circuito


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