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Crítica
"Cine Privê" trata da sexualidade em prosa segura
ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
O
universo dos contos de
Antonio Carlos Viana,
que lança agora mais
20 textos curtos em "Cine Privê", pela Companhia das Letras, é cheio de pequenos espantos, de transgressões mínimas que iluminam a vida dos
personagens, da sexualidade
incontornável de adolescentes
e velhos, de uma compreensão
muito delicada dos limites que
ultrapassamos no cotidiano e
de como eles nos dão forma e
nos definem.
Prostitutas, pais cruéis ou ignorantes, velhos em busca de
prazer e crianças apenas tentando entender as coisas do
mundo se sucedem nas histórias, que terminam, invariavelmente, de modo abrupto e melancólico: "Sem mais querer,
disse: "Pra mim, a vida acabou",
e começou a chorar. Minha
mãe com ele, nós depois, e todo
mundo também".
Em alguns textos, fica evidente a dívida do escritor com
Rubem Fonseca (como em
"Duas Coxinhas e um Guaraná") e Clarice Lispector ("Eliazar, Eliazar"), mas Viana, que
lançou o primeiro de seus livros
de ficção há mais de 30 anos, é
um autor seguro, consciente de
suas influências e de como pode manipulá-las em benefício
do que produz.
Precisão e ritmo
Ainda que sua literatura não
traga grandes ousadias formais,
escreve com uma firmeza que
não se encontra de modo rotineiro. A leitura dos contos de
"Cine Privê" não provoca aquela sensação tão comum de que
trechos deveriam ser cortados,
de que o tom ou o ritmo estão
inadequados, de que a narrativa não tem coerência interna.
Aqui o ajuste é preciso:
"Do terceiro velho conto depois. Primeiro falo dos dois que
me pegaram na esquina. Fui dizendo logo meus preços, é a primeira coisa que digo. Falei coisa e tal, quanto era com os dois
juntos, um de cada vez, e eles
chegaram logo a um acordo, cada um pagou a sua parte. Comigo é primeiro dinheiro na mão,
que não sou de levar furo".
Enfim, é um autor que merecia ser conhecido por mais gente. Por isso, para quem se interessar por "Cine Privê" fica a
recomendação para conferir
também "Aberto Está o Inferno" e "O Meio do Mundo e Outros Contos", que traz uma antologia dos três primeiros livros publicados por Antonio
Carlos Viana com organização
de Paulo Henriques Britto (ambos também publicados pela
Companhia das Letras).
ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura
da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da
USP.
CINE PRIVÊ
Autor: Antonio Carlos Viana
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 32,50 (128 págs.)
Avaliação: ótimo
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