São Paulo, quinta-feira, 23 de junho de 2005

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COMIDA

Guru da confeitaria prepara jantar para brasileiros em Versalhes

Revolução francesa

RITA LOBO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O menu apresentava ingredientes como jabuticaba, castanha-de-caju e mandioquinha, que, preparados sob rígidas técnicas francesas de cozimento, resultavam as intenções de dois países. Eram 22h do último dia 13 quando os convidados da noite de gala dos Amigos do Ano do Brasil na França, promovida por Lily Marinho no Castelo de Versalhes, acomodaram-se para jantar. Entre a cozinha e o salão, 80 pessoas trabalhavam para que tudo saísse como planejado. Para eles, o jantar era a etapa final de um processo iniciado dias antes, na cozinha central de Gaston Lenôtre. Na França, e no mundo da gastronomia, Lenôtre é uma lenda viva. Aos 85 anos, o chef confeiteiro, que abriu sua primeira loja na década de 40, na Normandia, ainda faz parte do conselho que administra o império criado em torno de seu nome. São nove butiques de gastronomia na França, 32 franquias pelo mundo, três restaurantes (entre eles o mítico Pré Catalan), duas escolas de gastronomia e o catering, que, além do referido jantar, organiza cerca de 6.500 eventos por ano.
Confesso que, para mim, há uns dez anos, Lenôtre era apenas o nome de uma loja ao lado da casa de uma amiga, em Paris. Certa vez, fui visitá-la e, para não chegar com as mãos abanando, comprei uma caixinha de chocolates lá. "Não precisava...", ela disse, agradecendo. Abriu a caixa, me ofereceu um bombom, comeu um e pensou em voz alta: "Não é incrível que seja tão bom?". Não entendi muito bem o comentário, mas fiquei sem jeito de perguntar.
Há três semanas estive em Paris e aproveitei para conhecer de perto a empresa que começou com uma confeitaria e hoje, controlada pela Accor (empresa de hotelaria, turismo e serviços), fatura 90 milhões por ano (cerca de R$ 260 milhões). Por telefone, Alexandra Peyromaure, diretora de comunicação de Lenôtre, explica que a cozinha central, a escola e o escritório ficam numa cidade a 40 minutos de Paris. Sugere que agendemos a visita para o dia seguinte. "Vou enviar por e-mail as direções para você chegar a Plaisir." Acho graça e pergunto novamente o nome da cidade. "É Prazer mesmo", responde. "Isso é típico do humor de Lenôtre, sediar a sua empresa numa cidade chamada Prazer!", completa.
Logo na recepção, fotos de macarrons coloridos dão água na boca. Alexandra me recebe em sua sala mostrando com orgulho as dezenas de livros de Lenôtre, da escola, de discípulos. Um deles é o chef Vincent Mary, que acaba de publicar o seu segundo livro. O chef é também professor da École Lenôtre. Ele me leva para conhecer as salas, ou melhor, cozinhas de aula da escola, a poucos metros dali. Para cada matéria, uma cozinha específica. Em cada uma, até 12 alunos põem a mão na massa instruídos por um chef-professor. A cozinha de panificação tem um aroma irresistível. A de cozinha de confeitaria é gelada!
Ali, entre os alunos, percebo que o comentário da minha amiga, feito há mais de uma década, guarda a essência da marca Lenôtre.
Só é possível que cada chocolate seja tão bom ou que cada prato servido num jantar para 600 pessoas esteja na temperatura certa, porque há rigor absoluto com a qualidade. E não só a dos ingredientes.


Rita Lobo é autora do livro "Cozinha de Estar", da editora Códex, e diretora do site www.panelinha.com.br
E-mail - rlobo@folhasp.com.br


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