São Paulo, segunda-feira, 23 de julho de 2001

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Vaziev desafia a tradição


Diretor artístico do Kirov busca repertório que una passado a Jerome Robbins e "o que há de mais atual"


Divulgação
Cena da montagem de "Manon", que faz parte do repertório do russo Kirov Ballet, que chega ao Brasil com 260 integrantes


INÊS BOGÉA
ENVIADA ESPECIAL A LONDRES

O Kirov Ballet dança no Festival de Campos de Jordão esta semana para dar início à sua terceira temporada brasileira. Nesta vinda, a companhia apresentará "Manon", "O Corsário" e "O Lago dos Cisnes", além de uma "Gala", que reúne trechos de coreografias.

Sob a direção de Makhar Vaziev, o Kirov viaja com 260 integrantes e vai dançar em várias cidades do país.
Vaziev nasceu em 1961 na Geórgia (ex-União Soviética). Aprovado em audição para a Academia de Ballet Vaganova, uma escola vinculada ao Kirov, teve de se adaptar ao seu rigoroso regime de treinamento. Em 1979, foi contratado como bailarino da companhia. Dezesseis anos depois, tornou-se o mais jovem diretor artístico da história do Kirov.
Para Vaziev, o Kirov ainda não é tão versátil quanto uma companhia clássica pode ser, mas está trabalhando nesta direção. Novos coreógrafos vêm sendo convidados a ampliar o repertório e revitalizar a semilendária companhia.
Nesta entrevista exclusiva para a Folha, em Londres, ele comenta a situação atual da Rússia e descreve os rumos da companhia.

Folha - Como é o Kirov de Vaziev?
Makhar Vaziev -
Nestes seis anos de trabalho, cada pequeno passo foi uma conquista. O importante é que a companhia está mudando: o repertório está se ampliando, e os bailarinos agora vêem o que acontece no resto do mundo.
Tenho tentado formar um novo tipo de artista, com outra filosofia. Arte é isto: estar atento. A estética muda; e, mesmo numa companhia clássica, os acentos e a forma geral de abordagem também devem ir se alterando.

Folha - A companhia mantém até hoje em seu repertório as coreografias de Petipa (1818-1910). Qual a importância desses balés?
Vaziev -
A dança tem um passado incrível; até hoje, nossa base. Não só Petipa, mas muitas outras peças tradicionais. Ali se pode encontrar amor, ódio, desafio -uma síntese do que é a dança.

Folha - A variedade de coreógrafos agora não causa dispersão?
Vaziev -
Estamos trabalhando com Neumeier, Jerome Robbins, Rolland Petit, Balanchine... A idéia é compor um repertório heterogêneo, que enriqueça o passado com o que há de mais atual.
Dançamos cada balé de um jeito, mas mantendo sempre o nosso estilo. O importante é tentar entender cada coreógrafo, sua linguagem. Introduzir novos balés é a política por excelência do Kirov.

Folha - Você iniciou sua carreira no Kirov em 1979, em pleno regime comunista. A situação hoje é muito diferente para a dança?
Vaziev -
Eu nasci em 1961. Cresci e fui educado nessa época. Agora é diferente, sim, e estou satisfeito com as mudanças que aconteceram no país. Estamos aprendendo a viver com a democracia, construindo uma nova sociedade.
Por outro lado, essa sociedade está deixando para trás muito do que havia de mais rico na cultura. É um problema talvez inevitável. A questão é como lidar com ele. Uma coisa é certa: sem paciência e tolerância não se chegará a lugar nenhum. Não gostaria de trocar a minha cidade [São Petersburgo" por nenhuma outra, apesar das dificuldades.

Folha - Dez anos de Rússia: como é dirigir uma companhia em meio à crise?
Vaziev -
Agora está se tornando mais fácil, na verdade, porque não temos mais um controle ideológico das artes, o que era muito assustador naquele tempo. A ideologia acima da cultura é uma limitação, uma restrição, a pior coisa que pode acontecer. Agora não temos mais isso, o que é ótimo.
Somos uma companhia estatal. Existem dificuldades, é claro, mas para tudo se encontram soluções. Problemas artísticos e financeiros estão sendo resolvidos, com sucesso, pelo diretor artístico do teatro Maryinsky, Valery Gergiev.

Folha - Esta será sua terceira vinda ao Brasil. Que imagem você faz do país?
Vaziev -
Só a terceira vez? O Brasil me parece tão familiar. Um desses lugares onde a gente sempre tem vontade de ir de novo. Lembro que foi uma surpresa, na primeira visita, a aceitação do público. Não imaginava que o balé fosse tão popular. O Brasil, para mim, é uma nação única. Um povo cheio de espírito, profundamente sensível. Se a recepção que tivemos antes se repetir, vamos querer voltar muitas vezes.


Inês Bogéa viajou a convite da Dell'Arte

KIROV BALLET - Apresentações de "O Corsário", de 23 a 25/8, às 21h; "Noite de Estrelas", dia 26/8, às 17h; e "O Lago dos Cisnes", de 30/8 a 1/9, às 21h, dia 2/9, às 17h. Onde: Credicard Hall (av. das Nações Unidas, 17.955, tel. 0/xx/11/5643-2500, São Paulo). Quanto: de R$ 50 a R$ 250. Em Campos do Jordão, dia 27/7, ingressos esgotados.


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