São Paulo, segunda-feira, 23 de julho de 2001 |
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Vaziev desafia a tradição
INÊS BOGÉA ENVIADA ESPECIAL A LONDRES O Kirov Ballet dança no Festival de Campos de Jordão esta semana para dar início à sua terceira temporada brasileira. Nesta vinda, a companhia apresentará "Manon", "O Corsário" e "O Lago dos Cisnes", além de uma "Gala", que reúne trechos de coreografias. |
Folha - Como é o Kirov de Vaziev?
Makhar Vaziev - Nestes seis anos
de trabalho, cada pequeno passo
foi uma conquista. O importante
é que a companhia está mudando:
o repertório está se ampliando, e
os bailarinos agora vêem o que
acontece no resto do mundo.
Tenho tentado formar um novo
tipo de artista, com outra filosofia.
Arte é isto: estar atento. A estética
muda; e, mesmo numa companhia clássica, os acentos e a forma
geral de abordagem também devem ir se alterando.
Folha - A companhia mantém até
hoje em seu repertório as coreografias de Petipa (1818-1910). Qual
a importância desses balés?
Vaziev - A dança tem um passado incrível; até hoje, nossa base.
Não só Petipa, mas muitas outras
peças tradicionais. Ali se pode encontrar amor, ódio, desafio
-uma síntese do que é a dança.
Folha - A variedade de coreógrafos agora não causa dispersão?
Vaziev - Estamos trabalhando
com Neumeier, Jerome Robbins,
Rolland Petit, Balanchine... A
idéia é compor um repertório heterogêneo, que enriqueça o passado com o que há de mais atual.
Dançamos cada balé de um jeito, mas mantendo sempre o nosso estilo. O importante é tentar
entender cada coreógrafo, sua linguagem. Introduzir novos balés é
a política por excelência do Kirov.
Folha - Você iniciou sua carreira
no Kirov em 1979, em pleno regime
comunista. A situação hoje é muito
diferente para a dança?
Vaziev - Eu nasci em 1961. Cresci
e fui educado nessa época. Agora
é diferente, sim, e estou satisfeito
com as mudanças que aconteceram no país. Estamos aprendendo a viver com a democracia,
construindo uma nova sociedade.
Por outro lado, essa sociedade
está deixando para trás muito do
que havia de mais rico na cultura.
É um problema talvez inevitável.
A questão é como lidar com ele.
Uma coisa é certa: sem paciência e
tolerância não se chegará a lugar
nenhum. Não gostaria de trocar a
minha cidade [São Petersburgo"
por nenhuma outra, apesar das
dificuldades.
Folha - Dez anos de Rússia: como
é dirigir uma companhia em meio à
crise?
Vaziev - Agora está se tornando
mais fácil, na verdade, porque não
temos mais um controle ideológico das artes, o que era muito assustador naquele tempo. A ideologia acima da cultura é uma limitação, uma restrição, a pior coisa
que pode acontecer. Agora não temos mais isso, o que é ótimo.
Somos uma companhia estatal.
Existem dificuldades, é claro, mas
para tudo se encontram soluções.
Problemas artísticos e financeiros
estão sendo resolvidos, com sucesso, pelo diretor artístico do teatro Maryinsky, Valery Gergiev.
Folha - Esta será sua terceira vinda ao Brasil. Que imagem você faz
do país?
Vaziev - Só a terceira vez? O Brasil me parece tão familiar. Um
desses lugares onde a gente sempre tem vontade de ir de novo.
Lembro que foi uma surpresa, na
primeira visita, a aceitação do público. Não imaginava que o balé
fosse tão popular. O Brasil, para
mim, é uma nação única. Um povo cheio de espírito, profundamente sensível. Se a recepção que
tivemos antes se repetir, vamos
querer voltar muitas vezes.
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