|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Comida
Carne de cavalo?!
É isto mesmo! A carne eqüina, suculenta e levemente adocicada, começa a chegar aos cardápios dos restaurantes de SP; até então, produção era toda exportada
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ela tem coloração intensa e é
bem suculenta. Aos olhos de
um leigo, seria facilmente confundida com uma carne bovina.
Na boca, diferencia-se pelo sabor mais forte e levemente adocicado. É carne do quê?! Carne
de cavalo... Basta juntar as três
palavras para ouvir reações adversas, provocadas geralmente
pela imagem dócil do animal.
Se em países como a França
há açougues especializados na
comercialização da carne do
eqüino e compêndios gastronômicos com verbetes dedicados
ao assunto, por aqui seu consumo ainda é novidade. O Brasil é
um dos maiores exportadores,
mas toda a produção tem destino certo: os países europeus.
Ou tinha. De maneira ainda tímida, a carne começa a ser servida no país. O Friccò, restaurante do chef italiano Sauro
Scarabotta, está testando a
aceitação dela.
"O brasileiro é muito carnívoro, mas quando sai da picanha e do filé mignon bovino, fica meio reticente", diz Scarabotta, que criou alguns pratos
com carne de cavalo. "Um ou
outro cliente sabia que na Europa se consome essa carne,
mas muitos perguntaram: "É
cavalo mesmo?". É porque aqui
servimos bife a cavalo, aquele
com o ovo em cima. Eu dizia: "É
carne de cavalo, não a cavalo"."
De sabor agradável, o melhor
jeito de degustá-la pela primeira vez -se a intenção for notar
bem a diferença de gosto em relação à bovina- é em preparos
crus, como um steak tartar, um
carpaccio ou um sashimi. Rica
em ferro, é recomendada aos
anêmicos. Porém, custa mais
que a bovina: de R$ 22 a R$ 28,
o quilo, dependendo do corte.
Mas se a carne é saborosa,
por que muitos brasileiros torcem o nariz ao ouvir falar nela?
"A repulsa não vem da carne,
porque quase ninguém a experimentou, e sim porque o cavalo é um animal querido, com o
qual as pessoas têm contato e
afinidade. É como se falássemos em carne de cachorro", diz
Guilherme Rinzler, diretor do
Pomar, frigorífico de Araguari,
em Minas Gerais, que há 47
anos exporta carne eqüina.
Os cavalos não são criados
para o abate. Provêm de fazendas e sítios onde são usados no
pastoreio. Ao chegarem a uma
idade mais avançada, são comprados pelos frigoríficos. O
abate de animais de hípica, por
sua vez, foi proibido para evitar
problemas com resíduos de remédios e anabolizantes.
"Quando vai ficando velho, o
cavalo de lida é uma dor de cabeça para o sitiante, que mal
consegue sustentar a família.
Isso acaba, não intencionalmente, gerando maus tratos. O
frigorífico torna-se uma solução", diz o professor do departamento de economia da Esalq-USP Roberto Arruda de Souza
Lima, que já publicou artigos
sobre carne de cavalo.
"Na Europa, a idéia de perder
uma carne nobre como a do cavalo, de deixar o animal morrer
no pasto, não existe", diz Michel Rinzler, dono do Pomar.
Para o italiano Sergio Gatti,
consultor de carnes exóticas
responsável pela divulgação da
carne eqüina, o consumo é uma
questão de hábito. "Na Itália,
somos acostumados a comê-la,
mas aqui há uma grande barreira. Por isso, comecei pelos
chefs estrangeiros, que já têm
essa proximidade", diz Gatti.
O chef Marcelo Pinheiro
conta que no restaurante Tarsila, em São Paulo, onde pratos
com carne de cavalo já foram
servidos, a aceitação foi boa.
"É uma carne diferenciada da
que estamos habituados. Mas
dependendo do corte, não difere tanto da bovina", diz. "Estou
fazendo um novo cardápio e
quero voltar a usá-la."
Para ser comercializada, a
carne precisa ter o SIF (Serviço
de Inspeção Federal), selo do
Ministério da Agricultura que
garante sua qualidade. Antes de
ser abatido, o animal passa por
uma análise clínica feita por
um funcionário do próprio órgão governamental. Depois, a
carne é inspecionada e testada.
"Não se come mais só para
suprir o consumo energético,
mas pelo prazer de conhecer.
Caso contrário, a gente se restringiria a comer só um tipo de
carne, de peixe. Comer faz parte da cultura que vamos agregando", diz Scarabotta.
Texto Anterior: Uruguaios do Movimiento Sexy participam de encontro em SP Próximo Texto: Crítica: Casa Santos conquista pelo agradável ar português, mas falha no bacalhau Índice
|