São Paulo, Sábado, 23 de Outubro de 1999
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ERUDITA
Karajan vira evento fonográfico

JOÃO BATISTA NATALI
da Reportagem Local

Bem merecidamente, é provável que jamais se deixe de homenagear Herbert von Karajan (1908-1989). Os dez anos de sua morte têm sido um dos eventos do ano da indústria fonográfica. A Deutsche Grammophon reedita cem gravações em 25 CDs. A EMI lança uma série de outros 30. A Sony relança em DVD concertos por ele gravados a partir dos anos 70.
É até que bem pouco para um maestro que começou a gravar no final da década de 30 e que deixou uma herança de aproximadamente 700 matrizes com diferentes orquestras e solistas.
No Brasil, como pequena amostragem, a Polygram, atual proprietária do selo DGG, produziu e está colocando no mercado, em dois CDs, a pequena antologia "Herbert von Karajan, a Lenda, in Memoriam".
O maestro austríaco comparece com aquilo em que sobrevive seu imenso vigor -Mozart, Bizet, Tchaikowski, Dvorak-, e também como referencial histórico, com duas gravações de Bach -concertos para violino, números 1.041 e 1.042 no catálogo BWV, com Christian Ferras-, nas quais sua leitura envelheceu.
A carreira do regente, iniciada em 1928 na Ópera de Ulm, foi suficientemente longa para que modismos e descobertas musicológicas a atropelassem em alguns de seus segmentos.
A partir dos anos 80 o público se habituou à execução do repertório barroco com formações reduzidas, instrumentos e afinação de época. O Bach de Karajan, com os 130 músicos que compõem a Filarmônica de Berlim, tornou-se um despropósito.
Mas nem por isso Karajan deixa de ser imaterial, perfeccionista, uma espécie de síntese de Bruno Walter, Furtwaengler e Toscanini, outros grandes nomes da regência deste século. O forte da antologia agora lançada está em duas sinfonias gravadas em momentos distintos de sua carreira. É a "Quarta", de Tchaikowski (1966), com a Filarmônica de Berlim, da qual foi diretor por 34 anos, e a "Oitava", de Dvorak (1985), com a Filarmônica de Viena, que ele nunca deixou de dirigir esporadicamente.
São duas belas e magníficas interpretações. O Tchaikowski é dissecado com o bisturi que põe em relevo as cores dramáticas, mas tratadas com estudado comedimento para não cair nos clichês do emocionalismo.
Quanto à "Oitava", ela provoca antes de mais nada saudades dos sopros da Viena que esteve recentemente em São Paulo. Karajan traz à luz o Brahms recôndito na partitura do compositor tcheco.
Trabalha com delicadeza extrema as cordas em seus registros mais graves, para em seguida soltar os demônios dos "tuti" em acordes de predominância aguda. O lirismo dos fraseados é ao mesmo tempo tenro e professoral.


Disco: Herbert von Karajan, A Lenda, in Memoriam Lançamento: Deutsche Grammophon Quanto: R$ 25, em média

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