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"CACHÉ"
Haneke se esconde com fortes imagens
THIAGO STIVALETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O título é apropriado. Em
"Caché" (escondido, em
francês), o austríaco Michael Haneke -diretor de "Funny Games
- Violência Gratuita" e "A Professora de Piano"- conta a história
de Georges (Daniel Auteil), um
apresentador de TV que começa a
receber vídeos anônimos em casa.
A imagem do vídeo é sempre a
mesma: uma tomada feita da rua
que mostra a fachada da casa,
pontuada por poucos movimentos de entrada e saída da família.
Não é só a câmera que está escondida. Aos poucos, Georges se
dá conta de que o remetente pode
ser alguém de um passado distante e também oculto, sobre o qual
ele nunca conversou com a mulher (Juliette Binoche). Logo se
descobre que a relação com o filho também não é das mais transparentes. Mais não se pode dizer
para não estragar a surpresa.
A maestria de Haneke, que ganhou a Palma de melhor diretor
em Cannes, consiste em trabalhar
com planos fixos de longa duração e grande força, que permitem
diversas interpretações. Os significados estão escondidos atrás da
imagem, e cabe ao espectador
descobri-los -ou, em muitos casos, simplesmente imaginá-los.
Nada ganha uma conclusão definitiva, nem mesmo no final.
Mais uma vez, o diretor explora
o lado sombrio da alma humana
-aquele que provoca medo e angústia. Constrói uma espécie de
intimismo negro. Com histórias
verossímeis e nada fantásticas,
apavora mais do que os filmes de
terror, embora o suspense criado
em sua obra esteja sempre mais
próximo do drama.
Em "Funny Games", o tema é o
sadismo quase lúdico de uma dupla de amigos que aterroriza uma
família em sua casa de férias à beira de um lago. Em "A Professora
de Piano", a paixão e a desilusão
amorosa são mostradas em seus
extremos. Neste "Caché", sondam-se os mistérios da culpa e do
ressentimento, sentimentos destruidores que podem se esconder
por trás até de atos esquecidos do
passado.
Em outra esfera, o cineasta contempla também um medo social
que não é menos sombrio. O elo
perdido do passado de Georges
tem a ver com a guerra de independência que a Argélia promoveu contra sua metrópole, a França, de 1954 a 1962. Ilustrados e civilizados, os franceses nutrem até
hoje um sentimento de culpa por
seus colonizados que passa por
um esforço de aceitação (não necessariamente inclusão) dos imigrantes argelinos no país. Apesar
disso, as diferenças sociais e econômicas nunca deixam de gerar
conflito -foco mais explícito de
outro filme do diretor, "Código
Desconhecido". Em "Caché",
Georges e Anne se esforçam para
serem "bons seres humanos",
mas seu mundo de classe média-alta só é arranhado pelos grandes
conflitos sociais por meio da TV.
Observações sociais à parte, cinema se faz pela montagem, como dizia Stanley Kubrick -e é
por meio de uma edição sempre
surpreendente que Haneke mistura presente, passado e memória
para desestabilizar de vez o espectador. Um filme para cabeças frias
e corações fortes.
Caché
Direção: Michael Haneke
Quando: hoje, às 18h50, na Sala UOL;
amanhã, às 17h50, no Reserva Cultural; e
dia 28, às 23h10, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex
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