São Paulo, sábado, 23 de dezembro de 2006

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Para Herzog, "fazer um filme na Antártida é fácil"

Diretor alemão roda documentário no continente e diz que é errônea sua imagem de local selvagem e hostil ao homem

"Temos café, salão de barbeiro, estação de TV, caixa automático. De que mais uma pessoa precisa?"

DEBORAH ZAKARENKO
DA REUTERS

Werner Herzog, que dirigiu filmes sobre ursos selvagens no Alasca ("O Homem Urso") e sobre um piloto de caça que teve seu avião abatido sobre o Laos ("Rescue Dawn"), acaba de concluir uma filmagem na Antártida e gostaria de deixar uma coisa bem clara: foi fácil.
Herzog, 64, filmou no monte Erebus, que abriga um vulcão ativo, durante a primavera antártida. Embora reconheça que estava frio e que sua equipe teve de passar dois dias se aclimatando antes de começar os trabalhos no pico de 4.118 metros de altitude -que parece ser mil metros mais alto devido à baixa pressão atmosférica-, ele elogiou as facilidades da locação.
"Foi fácil. A Antártida é fácil", disse, enquanto esperava sobre o gelo para embarcar em um jato militar, ao final da filmagem. O premiado cineasta, roteirista, ator e diretor de ópera alemão é mais conhecido por filmes de arte, como "Fitzcarraldo" e "Nosferatu".
Herzog diz que as pessoas têm impressão errada sobre a severidade das condições na Antártida, com base na era heróica de exploradores polares.
"É uma imagem perpetuada daqueles dias em 1903, 1910 ou 1911, quando Scott, Amundsen e Shackleton estiveram aqui."
Ele afirma que "agora, temos um café, um salão de barbeiro, uma estação de TV. Há até um caixa automático. De que mais uma pessoa precisa?". Essas são as facilidades disponíveis na estação McMurdo, a maior instalação científica norte-americana no continente, que Herzog usou como base para a filmagem de seu documentário.
"Bom sistema de transporte, uma cama confortável, um chuveiro", diz o cineasta, enumerando as condições que encontrou na Antártida. "É fácil, e ninguém deveria tentar perpetuar o aspecto de que se trata de um continente selvagem e furiosamente hostil ao homem." Ele se interessou pela possibilidade de filmar na Antártida depois de assistir a algumas imagens submarinas feitas perto da estação McMurdo pelo mergulhador e guitarrista experimental Henry Kaiser.
O diretor, que vive em Los Angeles, demonstrou entusiasmo quando Kaiser propôs que ele filmasse no continente, mas tinha certas dúvidas.
"Um dia, casualmente, ele me perguntou se eu não gostaria de vir à Antártida. E eu disse que sim, mas não tenho serventia aqui: não sou piloto, não sou cientista, não sei cozinhar, não sou mecânico. Sou desnecessário e um tanto inútil", disse. Herzog viajou como parte do programa da Fundação Nacional de Ciência norte-americana para artistas e escritores.
A Antártida há muito é um tema que cativa cineastas, começando ainda em 1913, quando um filme australiano sobre a vida na região foi lançado, e continuando até os pingüins do sucesso de animação desta temporada, "Happy Feet".
Muitas vezes, o tema desses trabalhos é a insensatez dos sonhos humanos de conquistar essa terra inóspita. O foco de Herzog era mais as pessoas que trabalham na Antártida hoje, e o clima agradável que ele encontrou não o agradou.
"Parecia uma série de cartões postais idiotas: céu azul todo dia", disse. "Meu sentimento gira basicamente em torno das pessoas que vêm parar aqui, os cientistas, os organizadores que trabalham por toda a comunidade, o pessoal da logística, o pessoal que lava a louça", disse. "Não é tão fácil encontrar bons homens e mulheres como estes em qualquer parte."


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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