São Paulo, segunda-feira, 24 de janeiro de 2005

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Diretor associa tráfico à ruína de cidades

DE LONDRES

Tudo o que viu e viveu ao longo de 18 meses, nas montanhas do Peru, na favela carioca e nas cidades colombianas, mudou a opinião do documentarista Angus Macqueen sobre drogas. Ele passou a defender, por exemplo, a legalização do consumo. Em entrevista à Folha, Macqueen afirma que ficou impressionado pela forma como o tráfico é capaz de destruir as sociedades.
"No Peru, você tem uma cultura sendo destruída. No Rio, você tem uma cidade sendo destruída. Na Colômbia, é um Estado, é o país inteiro."
A entrevista à Folha começou numa manhã agitada, no escritório da produtora October Films, onde Macqueen é um dos diretores. Continuou dentro de um táxi. E terminou em uma outra produtora, na qual Macqueen foi alugar um equipamento que levaria, nesta semana, para a Indonésia, onde pretende fazer um documentário sobre a reconstrução após o tsunami.
"O truque de fazer documentário é encontrar pessoas como o Zé e a Maria Cristina [Chirolla, chefe do departamento de combate à lavagem de dinheiro na Colômbia; ela é protagonista do terceiro episódio de "Cocaine"]. Quando você está sentado em sua casa em Londres, você pensa: eu conheço esse tipo. Você sente que você os entende", diz Macqueen.
Ele mesmo parece se envolver, de certa forma, com os personagens. Fala com tom de carinho e preocupação sobre Maria Cristina -que recebeu ameaças de morte enquanto o documentário era filmado na Colômbia- e Zé e sua família.
Segundo ele, a ajuda de Zé - o ex-traficante que hoje trabalha em um posto de gasolina durante o dia e de segurança privado à noite- foi fundamental. Só depois que a equipe de Macqueen o encontrou, por intermédio do motorista contratado por eles no Rio, é que as "portas" do Dona Marta começaram a se abrir.
O documentarista diz que uma das coisas mais impressionantes que acredita ter conseguido em "Cocaine" foi mostrar as etapas de produção da cocaína, exibidas, principalmente, no primeiro episódio filmado no Peru. Sobre o Rio, Macqueen se diz chocado por ter visto "adolescentes com armas, comandando as vidas de milhares de pessoas".
"A situação no Rio é a de uma casa de loucos", diz.
Tudo isso o levou a mudar de opinião sobre a legalização do uso de drogas. Segundo ele, a sociedade mente sobre a cocaína. Ele -que diz nunca ter experimentado- afirma que a droga vicia, mas mata pouca gente. E afirma que a "tragédia" que presenciou na América Latina não ocorre em razão dos danos que a cocaína causa ao cérebro das pessoas, mas porque seu uso é ilegal.
Macqueen -que já se expôs a situações mais perigosas no passado, como quando fez documentários em países do Leste Europeu nos anos 80- diz que não pretende ser visto como um herói e que seu objetivo é "buscar dar voz às pessoas cujas vozes não ouvimos". (EF)


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