São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2009

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TRECHO

Os subúrbios sonham com a violência. Adormecidos em seus modorrentos palacetes, protegidos por benevolentes shopping centers, esperam pacientemente pelos pesadelos que os despertarão para um mundo mais apaixonante...

Doce ilusão, pensei comigo enquanto o aeroporto de Heathrow ia diminuindo no espelho retrovisor, e das mais tolas: o arraigado hábito de um publicitário de saborear a embalagem em vez do biscoito. Mas eram pensamentos difíceis de afastar. Manobrei o Jensen para tomar a pista lenta da M4 e comecei a ler as placas que me davam as boas-vindas aos subúrbios mais afastados de Londres. Ashford, Staines, Hillingdom -destinos impossíveis que figuravam apenas nos mapas mentais de homens de marketing desesperados. Para além de Heathrow ficavam os impérios do consumismo, e o mistério que me obcecou até o dia em que saí pela porta da minha agência pela última vez. Como despertar uma gente entorpecida que tinha tudo, que comprara todos os sonhos que o dinheiro pode comprar e sabia que tinha sido uma pechincha?

Extraído de "O Reino do Amanhã", de J.G. Ballard


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