São Paulo, quinta-feira, 24 de fevereiro de 2005

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Madri celebra o expressionismo

DANIEL HORA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE MADRI

Quatro artistas queriam libertar a expressão e os hábitos sociais dos cânones acadêmicos e do bom gosto burguês. Aspiravam criar formas de expressão e transformar os valores morais e de comportamento. Em 7 de junho de 1905, formaram o grupo Die Brücke (A Ponte) e deram início ao expressionismo alemão.
Para celebrar o primeiro século do movimento, o Museu Thyssen-Bornemisza (www.museothyssen.org) e a Fundação Caja Madrid exibem até 15 de maio, na capital espanhola, a retrospectiva "Brücke - O Nascimento do Expressionismo Alemão", que reúne 190 trabalhos do grupo fundado em Dresden por Erich Heckel, Fritz Bleyl, Ernst Ludwig Kirchner e Karl Schmidt-Rottluff, ao qual se juntaram Max Pechstein, Otto Mueller e Emil Nolde.
A mostra está dividida em 11 núcleos. Permeia cada obra a estética inovadora do grupo: o uso de cores carregadas, o estilo de composição rápida, a aparência rústica e a representação de figuras nuas. Eles se inspiravam em imagens das culturas africana, oceânica e asiática, conhecidas por meio de publicações, museus e exposições antropológicas.
O primitivismo, que dá nome a um dos principais capítulos da exposição, constituía um ponto central para o Die Brücke. Seu projeto artístico ia além da apropriação essencialmente formalista do cubismo de Picasso.
A confraria alemã pretendia não só imitar a arte exótica como também desejava adotar um estilo de vida isolado dos progressos da modernidade, voltado à harmonia entre o homem e a natureza. O nudismo era prática habitual entre os artistas. "Foram pioneiros na busca de uma cultura extramoral", diz o curador Javier Arnaldo, comparando obras com as culturas beatnik e hippie.
Outro núcleo, "O Espetáculo como Ritual", enfoca o tratamento velado do primitivismo, juntando imagens de espetáculos de circo e cabarés, universo marginal e sensual, repleto de substratos da cultura popular. Já a seção "Nus na Paisagem" oferece vários registros dos banhos em riachos e repousos nas estâncias do grupo.
A nudez imersa no cotidiano também está presente em "Interiores com Modelo", com cenas dos estúdios onde trabalhavam, e em "Entre a Fonte e o Ápice", que trata da valorização do nu como símbolo do reformismo cultural da virada do século 19 para o 20.
O contraponto ao idealismo neo-romântico foi a cidade de Berlim, para onde os artistas se transferiram em 1911, começo de um afastamento que resultou na dissolução do grupo, em 1913.
Em "Os Selvagens na Cidade" predominam os retratos da vida urbana: vistas de espaços públicos, de locais de circulação e de bordéis. A esperança libertária cede lugar à crítica e à desolação. "Eles suspeitavam da iminência de uma crise social generalizada", afirma Javier Arnaldo, sobre a proximidade da Primeira Guerra.
O caráter provocador teria uma possível semelhança com a arte dos dias atuais. No entanto, o curador ressalta que aquilo que antes se propunha para chamar a atenção do público para a urgência de mudanças na sociedade é hoje instrumento do próprio status quo. "Agora a provocação serve muitas vezes à publicidade."


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