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HQ
Lançada na Itália há 16 anos, série sobre a captura do aventureiro alemão por índios tupinambás no séc. 16 chega ao Brasil
Hans Staden retorna para banquete canibal
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Josimar Fernandes de Oliveira,
ou Jô Oliveira, 60, se autodefine
como um quadrinista bissexto. É
só quando termina de confeccionar um novo selo para os Correios
ou uma série de ilustrações para
um livro infantil, que o artista gráfico pernambucano radicado há
20 anos em Brasília diz encontrar
tempo para criar suas HQs.
"Fazer quadrinhos me dá uma
certa preguiça. É algo muito longo", revelou, com tranqüilidade, à
Folha, o autor de "Hans Staden
-°Um Aventureiro no Novo Mundo", HQ de 71 páginas, em oito capítulos, que levou seis meses para
ficar pronta e nada menos do que
16 anos para chegar ao Brasil.
"Chegar" porque, antes de virar
álbum por aqui, pelas mãos da
editora Conrad, a série de HQs sobre a captura do aventureiro alemão Hans Staden pelos índios tupinambás, em 1553, já havia sido
publicada em três edições da revista italiana "Corto Maltese", casa de artistas como Hugo Pratt,
Milo Manara e Guido Crepax.
Nem assim Oliveira se deslumbra. Enquanto muitos desenhistas de sua geração procuravam
imitar o traço dos mestres dos
quadrinhos americanos ou europeus, ele preferiu correr "atrás das
raízes brasileiras" e adotou um
traço inspirado nas xilogravuras
que ilustram a literatura de cordel. "Meu trabalho é voltado para
o campo. Não consigo desenhar
linhas retas", conta.
Assim, como matéria-prima para a HQ de Staden, empregou
mais as versões de Monteiro Lobato do que o original "Hans Staden: Duas Viagens", publicado na
Alemanha em 1557 e que considera "às vezes cansativo".
"É uma história fantástica. Staden era um aventureiro, que só
queria conhecer o mundo, mas
acabou refém dos índios tupinambás por quase nove meses,
correndo o risco de ser devorado", empolga-se. "Essa HQ tem
que ser voltada para as crianças. O
grande público para o quadrinho
brasileiro está nas escolas. A disciplina história é dada de maneira
muito chata. História é aventura."
Por pensar desta forma, Oliveira
dividiu a HQ em capítulos que
procuram sempre terminar com
um gancho - "Arrastado até a
vila, o alemão tinha certeza de que
seria trucidado imediatamente",
"Assustado? Pois saiba que tu poderás ser o próximo" etc.
Também para saltar direto à
ação, o pernambucano preferiu
suprimir a primeira das duas viagens de Staden ao Brasil. "Ele chegou em um povoado próximo do
Recife, cercado de índios. É pequeno demais para uma história."
As boas relações com a Europa,
estabelecidas no início da década
de 70, quando foi cursar a Escola
de Artes Gráficas na Hungria,
abriram espaço para as histórias
de Oliveira em países como Itália,
Espanha, Dinamarca e Grécia.
Seus trabalhos foram exibidos
nos festivais de Lucca (73/74) e
Angoulême (86).
A mesma "Corto Maltese", em
1984, publicou uma HQ de oito
páginas inspirada na construção
da ferrovia Madeira-Mamoré, a
mesma que rendeu a atual minissérie da Globo "Mad Maria", baseada no romance homônimo de
Márcio Souza. Dez anos mais tarde, foi a vez de a Embaixada da
Espanha, em Brasília, apoiar a
criação da HQ "As Amazonas",
inspirada nas índias lendárias do
Norte brasileiro.
"Essas mulheres capturavam os
índios jovens para fazer amor
com elas. Os filhos que nascessem
homens eram mortos ou devolvidos, e as meninas ficavam. Há
uma série de mistérios no ar. São
elementos ideais de uma história
em quadrinhos, mas também são
reais", conta ele, que espera levar
o projeto adiante no futuro.
Antes disso, Oliveira pretende
concluir, ainda neste ano, uma
parceria que iniciou com o cordelista Jota Borges. Aproveitando as
comemorações do bicentenário
de Hans Christian Andersen, a
dupla está adaptando as fábulas
do escritor para a literatura de
cordel. "Por causa do cordel, para
mim, os contos de fadas sempre
foram nordestinos. Quando era
pequeno e ouvia as histórias dos
irmãos Grimm e de Andersen,
imaginava a paisagem do Nordeste. Não entendia o que era neve."
O cangaço nordestino, que já retratou na HQ "A Guerra do Reino
Divino" (Herdras, 2001), também
continua nos planos do artista.
"Há um lado mítico na morte de
Lampião, todas as artes brasileiras já fizeram algo sobre ele." Sem
pressa, um dia sai a sua.
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