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BIA ABRAMO
Moldura paradidática
Em "Queridos Amigos", personagens estão acossados pela história e não pela memória
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PARA QUEM tem mais de, digamos, 35 anos, é difícil ficar insensível à "Queridos Amigos",
a nova minissérie de Maria Adelaide
Amaral que estreou na última segunda-feira.
Está lá um pedaço de memória
muito vívida para os brasileiros nascidos até o início dos anos 70: o ano é
1989, da primeira eleição direta para
a Presidência da República depois
do golpe de 1964.
Em termos dramáticos, não poderia haver período melhor: os personagens, ao mesmo tempo, têm que
se haver com as escolhas de juventude, algumas delas ainda marcadas
pela radicalidade típica da geração
do imediato pós-Segunda Guerra, e
com a debacle das possibilidades
utópicas tanto no plano histórico-político, assinaladas pela queda do
Muro de Berlim, como no pessoal.
Um grupo de amigos, virando a esquina dos 40 anos no final da fatídica
década de 80, volta a se reunir, por
insistência de um deles, o escritor/
publicitário Léo (Dan Stulbach), que
está doente. São professores, artistas, jornalistas, todos com um passado ligado à esquerda e às mudanças
comportamentais da década de 60,
ao refluxo político dos anos 70 e ao
desencanto da década que sepultou
o século 20.
A fórmula já foi usada no cinema
-"O Reencontro", de Lawrence
Kasdan em 1983; "Para o Resto de
Nossas Vidas", de Kenneth Branagh
em 1992- e, nos dois casos, resultou
em filmes, se não brilhantes, simpáticos e emocionantes. Como na minissérie de Maria Adelaide Amaral, o
balanço da geração do baby boom
tem uma certa amargura e desencanto que acabam por tocar a todos
que estiveram por lá.
Em "Queridos Amigos", entretanto, ao balanço existencial de uma geração se impõe uma moldura paradidática que tenta "explicar" tudo o
que acontece reiterando de forma
mecânica as ligações com a história.
Como nas minisséries "Um Só Coração" e "JK", parte-se do pressuposto
de que os indivíduos estão como que
acossados pela história (e não pela
memória), o que resulta em narrativas esburacadas pela obrigatoriedade de fazer referências emblemáticas a todo momento.
É como se a vida privada de determinado período se desse na frente
de um pano de fundo de uma apresentação em Power Point, onde se
sucedem as imagens, os sons, os objetos, as palavras típicas daquele momento.
Mesmo que a autora não classifique "Queridos Amigos" como "histórica" e tenha baseado a série em
obra original, o molde da história, ao
menos nos primeiros capítulos, se
impôs. Além de empobrecedor para
a história e para a narrativa, resvala
fácil, fácil na chatice pura e simples.
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