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Crítica/ "Heligoland"
Massive Attack se mantém vivo com disco frio e emocional
Desde os anos 1990 a dupla inglesa de trip hop produz música interessante
EDGARD SCANDURRA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Nos anos 1990, enquanto o rock and roll ia para o estaleiro cuidar de
necessárias reformas, uma nova onda de excelentes DJs e
produtores surgia, apresentando uma opção revolucionária
em ouvir, criar e dançar aquela
música tecnológica, transcendental, tribal, minimalista, acelerada, grave.
Existiu, então, uma questão
desafiadora: Como fazer uma
música orgânica, tocada por
instrumentos de verdade, ser
interessante e inovadora, frente a essa cena de loops, samples,
computadores e máquinas da
música eletrônica? Foi pelo caminho da dança lenta, calma,
romântica, adulta e, quase sempre, hipnótica do trip hop, representado por nomes pioneiros como Trick, Portishead e principalmente pelo grupo inglês Massive Attack que se enfrentou esse desafio.
Duas décadas após o seu início e sete anos depois de seu último trabalho (o fantástico
"100th Window"), ouço esse
novo CD e noto, feliz, que eles
ainda fazem obras de arte em
suas músicas. Unindo incríveis
levadas de baixo acompanhadas por baterias de estranhas
afinações, timbres soturnos e
misteriosos, aos sussurros do
mentor Robert "3D" del Naja e
Grant "Daddy G" Marshall, a
linda voz de Martina Topley-Bird, a inconfundível voz trêmula do veterano cantor de
reggae Horace Andy e a sempre
feliz escolha dos convidados
-como Damon Albarn, da banda Blur-, faz este disco do
Massive Attack (assim como os
anteriores) ter verdadeiros momentos de genialidade.
Eles me passam uma sensação do músico que vive a música pela música, sem afetações.
Nada fashion. Me lembro em
1998 quando eles tocaram após
apresentação do Kraftwerk, em
São Paulo, no antigo festival
Free Jazz. Muitos da plateia foram embora após o show dos
alemães, pois parecia que mais
nada podia superar o espetáculo robótico. Porém, quem ficou
viu um grupo potente, maduro,
com os músicos e seus crachás
pendurados, suas "pochetes"
na cintura, camisetas de algodão, desencanados, fazendo um
som forte e condutor de sensações -que o trip hop sabe muito bem nos levar.
Meu Deus! Em quantos
"chill-outs" eu me joguei, descansando o corpo cansado, pós
raves e clubes, ouvindo Massive Attack e outros sons viajantes, nos anos 1990? Centenas
de vezes, certamente.
Por isso, a princípio, não tinha gostado deste disco. Ter algo de nostálgico não combinava com um grupo que soava tão moderno até pouco tempo.
Foi aí que dei a mesma chance que se deve dar a qualquer
trabalho inspirador e descobri
riqueza em todas as faixas deste
disco. Pesquisei e vi que o título
do CD, "Heligoland", é o nome
de um arquipélago alemão. Não
é por menos. Frio e emocional como é este disco, o nome de uma cidadezinha do litoral alemão pode passar sensação bem semelhante.
A boa música nem sempre é
atemporal. Ela registra momentos, como um trilha sonora. Assim, o Massive Attack se
mantém vivo e interessante,
pois como sugere um ditado cigano: O futuro está lá atrás.
EDGARD SCANDURRA é músico
HELIGOLAND
Artista: Massive Attack
Lançamento: EMI
Quanto: R$ 30, em média
Avaliação: ótimo
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