São Paulo, Sábado, 24 de Abril de 1999
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CINEMA - FRANÇA
"Romance" bota pornografia na arte

Reprodução
Os atores Rocco Sifredi e Caroline Ducey em cena do filme "Romance", de Catherine Breillat, que tem cenas de penetração e sadomasoquismo


PAULO ALVES
especial para a Folha

Está lembrado ou já ouviu falar do escândalo e da polêmica que causaram os filmes "O Último Tango em Paris" e "O Império dos Sentidos", catapultados da França para o mundo nos anos 70?
Então prepare-se: "Romance", que estreou no último fim-de-semana em Paris, retoma a polêmica em torno de cinema e pornografia e promete transformar em simples aperitivos as famosas cenas da manteiga no filme de Bernardo Bertolucci e da amante que bota ovo e decepa o pênis do amado na epopéia sexual de Nagisa Oshima.
Um plano-sequência de nada menos que oito minutos de sexo total e cenas reais de penetração, felação e sadomasoquismo, além do cartaz que traz um close semi-encoberto de uma mulher se masturbando, estão entre as mais óbvias credenciais para a polêmica que a fita está provocando mundo afora.
"Romance", que já foi exibido no Festival de Berlim no início do ano e tem estréia prevista no Brasil para julho, coloca Paris de novo no centro da controvérsia. É o sexto e mais recente filme da escritora, roteirista e cineasta Catherine Breillat.
Mas, certamente, a polêmica não é o único aspecto positivo da fita. Breillat, que em 1968, aos 17 anos, teve seu primeiro livro proibido (na França!), há muito pesquisa os caminhos e a inserção sócio-cultural da mulher no mundo contemporâneo. Com o filme, ela quer chamar para o debate em torno da condição da mulher, sobretudo nas relações de casal.
Ainda desconhecida no Brasil, Breillat é uma artista respeitada. Em 1996, teve seu filme "Parfait Amour" incluído na lista dos dez melhores da prestigiosa revista "Cahiers du Cinéma" e ganhou uma retrospectiva no Festival de Bergamo, na Itália.
A diretora decidiu filmar "Romance" durante uma conferência em 1997, em Teerã, no Irã, sobre a presença da mulher no cinema. E incluiu, no prólogo do filme, o trecho mais significativo desta sua exposição. O filme foi exibido no início deste ano nos festivais de Roterdã (Holanda) e de Berlim (Alemanha).
"Romance" tem algumas semelhanças com "A Bela da Tarde", de Luis Buñuel: conta a história da bela Maria (a atriz Caroline Ducey), uma mulher rejeitada por seu amor platônico, o marido Paul (Sagamore Stevenin). Ele não a toca mais e encara com indiferença e normalidade seu completo desinteresse sexual.
Marie fica mal com a história e mergulha em uma busca sentimental do prazer. Acaba por encontrar em dois amantes e em um estuprador o amparo que lhe é negado por seu marido.
Um de seus dois amantes é interpretado por Rocco Siffredi, o ator pornô italiano mais famoso da atualidade, que Breillat fez passar incógnito para toda a equipe durante as filmagens. Dono de um pênis de 26 cm de comprimento e 16 cm de circunferência, parece ser o consolo e a redenção de Marie, que trava com seus amantes relações sadomasoquistas, violentas e submissas.
Os detalhes são captados pela lente do grande Yorgos Arvanitis, fotógrafo do belo "A Eternidade e Um Dia", de Theo Angelopoulos, que consegue uma luminosidade incomum do corpo de Marie, mesmo na penumbra.
Quando viu "Romance" pronto, a atriz Caroline Ducey, escolhida entre as mais de 200 candidatas para o papel, disse não acreditar que seria capaz de fazer o que conseguiu durante as filmagens.
"Não tinha a menor idéia do que estava acontecendo, mas confiava cegamente em Catherine", declarou a atriz na primeira exibição mundial do filme, realizada durante o Festival de Cinema de Roterdã, em fevereiro.


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