São Paulo, Sábado, 24 de Abril de 1999
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Nem romance, nem arte

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
de Paris

"Romance", pornografia ou arte? A pergunta que embala o marketing do filme da diretora francesa Catherine Breillat é falsa. Apesar da presença de um pênis de 26 cm e de longos closes reflexivos, não é nem uma coisa, nem outra.
O filme conta a história de um relacionamento em crise: Marie é uma mulher ainda apaixonada; Paul, seu companheiro, um homem que não se deixa tocar. Num esforço sublime ela tenta uma felação. A resposta é negativa.
Para satisfazer seu apetite sexual ela sai à cata de amantes. A primeira presa é um jovem doce e potente, mas incapaz de tocar seu coração. O ator, Rocco Siffredi, na vida real uma estrela do pornô, gaba-se por possuir um membro incomum. O sexo é explícito.
Breillat explora ambiguidades fáceis. Marie é uma professora primária disléxica. Seu segundo amante é o diretor da escola onde trabalha. Um sádico cavalheiro.
Assim, pouco a pouco, ela descobre os prazeres do sexo, ao mesmo tempo que o relacionamento com Paul vai se distanciando. Numa de suas aventuras, ela é estuprada (não existe prazer sem dor) e fica grávida (a paternidade da criança é desconhecida). O que se segue é uma mensagem tradicional: a redenção vem com a maternidade.
O filme retrata uma Paris contemporânea e preocupada com as aparências. Os apartamentos e as roupas são o retrato exato dos estados de espírito dos personagens. No início, Marie e Paul vestem-se de branco e habitam pequenos apartamentos também brancos. Já o diretor sádico vive num apartamento vermelho e preto. Ao descobrir o próprio prazer, Marie também já se veste de vermelho.
Uma opinião masculina está sempre sob suspeita quando uma obra se propõe a encarar o mundo a partir da visão feminina. A possível reação à crítica é dizer que um homem não pode compreender os meandros da alma feminina e, muito menos, sua sexualidade.
O que se pode dizer é que Breillat, apesar da proposta feminista, reforça o ideário masculino da sexualidade feminina: frigidez inicial, descoberta do prazer pela dor e, por fim, a alegria maternal dessexualizada. A mensagem, portanto, não é pornográfica, nem artística, muito menos política.


Avaliação:



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