São Paulo, segunda-feira, 24 de junho de 2002

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ANÁLISE

Acima do bem e do mal

DA REDAÇÃO

O homem e sua cultura são o epicentro da obra de Verger. Raro ver uma imagem sua onde o homem ou a ação do homem não seja o foco principal.
Mas, definitivamente, Verger foi um etnólogo que fotografava, e não vice-versa. O inestimável valor documental e acadêmico de sua obra fotográfica agiu, de certa forma, em detrimento de um padrão estético mais requintado. Era um fotógrafo que não se preocupava em ter ruídos na sua composição. Ao contrário, parecia ter certo apreço por isso.
"Reconheço com prazer que negligenciei frequentemente o lado estético em prol da espontaneidade das expressões e das cenas a captar", disse em uma entrevista em 1954.
Verger acreditava que o valor de um flagrante era infinitamente superior ao de uma foto posada, mesmo que isso incorresse no risco de obter imagens com qualidade técnica discutível.
Claramente acreditava que o espontâneo poderia lhe render algo mais próximo da verdade, do mundo real. Dessa forma conseguiu fugir completamente do exotismo banalizado, um limite bastante tênue para quem se aventurou por lugares como Bamako, Keto, Salvador, Havana e Tóquio, por exemplo.
A busca pelo "momento único", celebrizado pelo fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson, levou Pierre Verger a conseguir imagens belíssimas, como a da criança dormindo em Benin (foto principal desta página).
O diabo, no entanto, reside no fato de em todas as exposições do artista aparecerem mais e mais fotos inéditas que, francamente, deveriam continuar inéditas pelo fato de nada acrescentarem à trajetória de Verger ou até por acabar enfraquecendo o todo de sua obra. É o que acontece no livro e na exposição de agora com as fotografias realizadas em São Paulo e em Brasília, por exemplo.
Não há gênio da fotografia que não necessite de uma edição que organize e ordene uma lógica interna ao trabalho.
E, cá entre nós, Verger já está acima do bem e do mal. Não são novos fatos, ou fotos, que irão mudar isso.
(EDER CHIODETTO)


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