São Paulo, quinta-feira, 24 de junho de 2004

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ARTES VISUAIS

Mostra que tem início em SP apresenta a produção dessincronizada que marcou o modernismo em Portugal

MAM agrega solitários da arte portuguesa

JULIANA MONACHESI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Cinco artistas portugueses "fronteiriços", que traçaram os contornos de uma arte mais fincada em seu próprio tempo por meio de um discurso crítico em relação à modernidade, são devidamente apresentados ao Brasil em exposição que tem abertura hoje no MAM de São Paulo.
Se os nomes de Amadeo de Souza-Cardoso, Almada Negreiros, Vieira da Silva, Joaquim Rodrigo e Paula Rego não nos são estranhos, a produção desses artistas não é conhecida em profundidade pelo público brasileiro. Com 50 obras vindas de diversas instituições, a mostra concebida por Pedro Lapa é ambiciosa no tamanho e no conceito.
O curador defende que foram esses artistas os responsáveis pela internacionalização da arte portuguesa. Vítima das condições impostas pelo fascismo, a produção artística em Portugal viveu enclausurada durante a primeira metade do século 20. Por conta disso, o naturalismo do século 19 estendeu-se excessivamente na história. O surrealismo, por exemplo, só aparece no país em 1948, segundo Pedro Lapa.
Nos anos 40 houve uma "renovação atrasada" na arte portuguesa, mas de forma muito comprometida com as vanguardas européias. "Os responsáveis por esse movimento, ainda que tenham contribuído para a constituição de uma modernidade em Portugal, não possuem relevância no cenário internacional" -justifica assim as suas escolhas.
Amadeo de Souza-Cardoso (1887-1918), que dividiu estúdio com Modigliani em Paris e conviveu com Brancusi, transitou por vários estilos, mas sempre de maneira estilizada, buscando um sentido próprio.
Em viagem a Portugal para passar as férias em 1914, não pode mais deixar o país com o início da guerra, e "toda a sua produção dali em diante vai ser marcada pela memória do que viu e pela experimentação que empreenderá, como se estivesse refazendo o passado". Elementos órficos e futuristas reaparecem recontextualizados, com a incorporação paralela de elementos populares.
José de Almada Negreiros (1893-1970), conhecido como poeta futurista, a partir da década de 20 dedicou-se apenas ao trabalho visual, buscando a pureza do desenho e a racionalização da arte. Na pintura "Começar", assim como em alguns auto-retratos que integram a mostra, fica evidente a articulação de suas várias pesquisas sobre o cânone da construção e da proporção.
Defendendo uma visão oposta a essa, Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) ficou conhecida pela pesquisa da relação entre cor e espaço, "como elementos que coabitam afastados por um intervalo, que indica a impossibilidade de síntese na arte", afirma o curador.
Em telas como "Enigma", de 1947, a tensão ótica entre os elementos é desenvolvida com maior complexidade. "Toda a sua pintura se faz sobre essa incerteza, mostrando um constante fluxo e refluxo de profundidade."
Joaquim Rodrigo (1912-1997) e Paula Rego (1935) rompem mais radicalmente com a tradição moderna. O primeiro por adotar abertamente o desenvolvimento de narrativas em sua obra. Outra marca de seus trabalhos é a busca de cores e símbolos de outras culturas, em uma referência às guerras coloniais portuguesas.
Já Paula Rego é quem insere uma dimensão pulsional e um desejo de fabulação na pintura. A artista vive em Londres e é consagrada internacionalmente, conhecida por retratar em suas obras o lado obscuro da natureza humana. O recorte de sua produção na mostra, entretanto, é centrado nas colagens dos anos 60, que encenam o rebaixamento, o âmbito incontrolável da vida e evocam temas que vão da sexualidade à alegoria política.


CINCO PINTORES DA MODERNIDADE PORTUGUESA (1911-1965). Onde: MAM (pq. Ibirapuera, portão 3, SP, tel. 0/ xx/11/5549-9688). Quando: abertura hoje, às 19h30; de ter. a sex, das 12h às 18h; qui., até 22h; sáb. e dom., das 10h às 18h; até 12/9. Quanto: R$ 5.


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