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CINEMA
No Brasil, sueco se interessa por futebol e pelo MST
"Quero que o público sinta raiva", diz o cineasta Lukas Moodysson
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Com "Amigas de Colégio"
(1998) e "Bem-Vindos" (2000),
seus primeiros longas, o diretor
sueco Lukas Moodysson divertiu
platéias de diversos países e angariou enfáticos elogios até de Ingmar Bergman ("O Sétimo Selo"),
o expoente do cinema de seu país.
Fama feita, Moodysson resolveu fazer os espectadores sentirem "raiva, não tristeza", com a
saga de "Para Sempre Lilya", que
tem exibição hoje e amanhã no
Festival Internacional de Cinema
de Brasília, na Academia de Tênis,
e na próxima semana (dias 28 e
31) no CCBB do Rio, que abriga
um resumo do festival. A estréia
nas salas está prevista para o dia
20 de agosto.
A Lilya do título é uma adolescente russa que se prostitui para
sobreviver num país que sucumbiu à crise econômica e subtraiu
de seus jovens toda perspectiva.
Talvez o relato desesperançado
do aviltamento de "Lilya" surpreenda o espectador da obra de
Moodysson, 35, no Brasil. Na Suécia, porém, o público habituou-se
a vê-lo como um provocador,
desde sua estréia, que ganhou o
grande prêmio do cinema no país,
numa cerimônia (transmitida pela TV) em que Moodysson fez
gestos ofensivos para a platéia,
reagindo às vaias com que a platéia, por sua vez, reagia ao seu longo e contestatório discurso.
No Brasil para acompanhar as
exibições de seu filme, Moodysson usou da ironia de "enfant terrible" para responder ou desviar
das perguntas da Folha.
Folha - Depois de dois longas divertidos, por que você fez um filme
triste, sombrio, desesperançado?
Lukas Moodysson - Não foi uma
decisão consciente. Não escolho
minhas histórias, elas é que me escolhem. Não tenho nem certeza
de que quero fazer filmes. Gostaria de ser ciclista, ou trabalhar
com crianças, ou escrever poesia,
ou ser fotógrafo ou qualquer outra coisa. Infelizmente, tenho de
fazer filmes. Alguém assopra no
meu ouvido: é isso o que você tem
que fazer. E não posso resistir.
Folha - Qual é o sentido de fazer o
público sofrer solidariamente com
uma situação que desconhece? Você quer provocar nas platéias tanto
a diversão quanto a reflexão ou
apenas uma das duas?
Moodysson - Depende de que
público se está falando. O filme
fez grande sucesso na Moldávia,
um país em que quase todo mundo conhece alguém que esteve em
situação parecida [com a de Lilya]. Esse é meu público-alvo. Mas,
se for um público distante da realidade do filme, quero que abram
os olhos, que se sintam mal, que
fiquem com raiva, não tristes.
Folha - Você já disse que não se
importa com os filmes de Bergman
e que é menos inteligente do que o
dinamarquês Lars von Trier, mas
faz filmes melhores do que os dele.
É um comportamento de quem diz
sempre tudo o que pensa ou de
quem quer fama de polemista?
Moodysson - Não digo sempre
tudo que penso. Sou tímido. Mas
tento. Não, não tento. Na verdade,
tento falar o menos possível.
Folha - Você considera o cinema
uma forma de política?
Moodysson - Especialmente
Hollywood, que é uma máquina
de propaganda. Logo, também
sou. Só que muito menor e, tomara, mais independente.
Folha - Seu próximo filme é sobre
relações familiares. Será uma espécie de seqüência de "Bem-Vindos"?
Moodysson - Não. Será provavelmente mais próximo de "Para
Sempre Lilya", mas é algo novo.
Sinto como se fosse meu primeiro
filme. É o meu primeiro filme.
Folha - Que aspecto do Brasil
mais lhe interessa nessa visita?
Moodysson -A confusão, a gentileza, o clima, o futebol, o fosso entre ricos e pobres, a teologia da libertação e o MST [Movimento
dos Sem Terra]. Mas, infelizmente, sou preguiçoso. Acho que minha estada aqui terá mais a ver
com as três ou quatro primeiras.
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