São Paulo, domingo, 24 de julho de 2005

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Financiada por governos latinos, Telesur entra na "guerra" de informação contra TVs dos EUA

Soy loco por ti

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Nosso norte é o Sul. Com esse slogan, entra no ar hoje a Telesur, TV financiada pelos governos de Venezuela, Argentina, Cuba e Uruguai e que tem o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
No Brasil, a estréia poderá ser vista, a partir das 13h (horário de Brasília), por meio de antenas parabólicas, algumas TVs comunitárias e educativas e pela internet. O canal será bilíngüe, com legendas em português em transmissões em espanhol, e vice-versa, tradução simultânea ou dublagem.
O projeto é do presidente venezuelano Hugo Chávez, enfrenta em seu país oposição da mídia comercial, e a sede é Caracas, o que ajuda a explicar por que, mesmo antes da estréia, essa estação latina já tenha se envolvido em tantas polêmicas. Só nas últimas duas semanas, e apenas para ficar nos "incidentes" da Colômbia, a Telesur virou manchete de jornal em duas ocasiões:
1) Utilizou em uma propaganda o refrão de "A Luz de Tieta", de Caetano Veloso ("eta, eta, eta, é a Lua, é o Sol, é a luz de Tieta, eta, eta"). Foi acusada de apoiar o grupo terrorista espanhol ETA.
2) Exibiu em vídeo promocional a imagem de Manuel Marulanda, o Tiro Certeiro, líder das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O governo colombiano se disse "magoado". Chávez respondeu que a questão é retratar "eventos históricos".
A Telesur tem como lema integrar os povos latino-americanos e se contrapor à imagem da América Latina veiculada por grandes redes internacionais. Em outras palavras, tem a CNN como grande inimiga, o que já lhe rendeu o apelido de Al Jazira latina.
A diferença entre o canal árabe e o latino é que o primeiro é privado, e o segundo, financiado por verba estatal de quatro países -o que torna mais política a "guerra" de informações com os EUA.
Nesta semana, como reação ao marketing de lançamento da Telesur, a Câmara de Representantes do Estados Unidos debateu o início de transmissões de rádio e TV a venezuelanos a fim de combater o "antiamericanismo" da Telesur com notícias "objetivas".

Brasil
O Brasil não será sócio, mas dará apoio logístico e prevê troca de conteúdo entre a Telesur e seu futuro canal internacional. Um dos diretores da TV latina é o jornalista brasileiro Beto Almeida, que atuou como âncora nas transmissões experimentais da TV Brasil e será um dos apresentadores da estréia da Telesur.
Almeida conta que conheceu o presidente Chávez em 2000, quando o venezuelano esteve em Brasília para uma palestra. "Eu era do sindicato dos jornalistas e entreguei a ele uma carta com propostas para uma integração latino-americana por meio de veículos de comunicação. Ele leu na hora, gostou e disse que ia me convidar futuramente para o projeto da Telesur. Cumpriu a promessa."
Além do diretor, o Brasil terá dois correspondentes da Telesur.
O canal entra no ar hoje com a instalação do conselho assessor, formado por 35 personalidades de vários países. Após os discursos oficiais, haverá noticiário, documentários e outras atrações.
Sobre Simón Bolívar, que lutou pela independência da América espanhola e pregava a unidade dos países do continente, haverá só na estréia quatro programas (explica-se por que a Telesur, além de Al Jazira latina, é chamada de Al Bolívar). Não é demais?
"A grande massa desconhece quem foi Bolívar. O que é demais é a Xuxa e o Faustão terem tanto espaço. Na TV há muito tempo para nada", afirma Almeida.
Na primeira etapa, serão quatro horas inéditas reprisadas ao longo das 24 horas que permanece no ar. Os planos são de aumentar para oito horas em setembro.
Mais de 50% da programação serão preenchidos por noticiários, com reportagens produzidas por jornalistas da Venezuela e correspondentes internacionais (além do Brasil, são mais sete países). Haverá programas sobre música, documentários e filmes latinos. Um dos ciclos é "Nojolivud", uma mistura de "nojo" com "Hollywood", para produções "excluídas" do circuito comercial.
A transmissão é feita via satélite e pode ser captada gratuitamente por antenas parabólicas e qualquer emissora no continente americano, Europa ocidental e norte da África. A Telesur negocia também acordos de transmissão de parte de sua programação por TVs pública, educativas e comunitárias. Tenta ainda distribuição por TV paga, mas teme enfrentar resistência pelo fato de a maioria das operadoras pertencer a grandes grupos norte-americanos.
No Brasil, além dos 12 milhões de parabólicas, há acordo fechado com a comunitária de Brasília e a educativa do Paraná (com transmissão também via internet).


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