São Paulo, sexta-feira, 24 de julho de 2009

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Produtoras encolhem com a crise financeira

Hoje, só 12 empresas independentes de médio porte atuam em Hollywood

No início de 2008, o número chegava a 38; modelo sente a escassez de crédito e é prejudicado pela opção por superproduções juvenis

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA, EM NOVA YORK

Wall Street fica longe de Hollywood, mas o impacto da crise no mercado financeiro dos EUA foi sentido pela indústria cinematográfica como se o mesmo abalo sísmico tivesse atingido Nova York e Los Angeles, com efeitos devastadores no cenário independente e reverberações significativas nos grandes estúdios.
No início de 2008, havia 38 produtoras independentes de médio porte atuando em Hollywood; hoje, restaram 12. A Warner, maior estúdio do mercado, encerrou nesse período as atividades de duas divisões autônomas (Warner Independent Pictures e Picturehouse), e assumiu o controle da terceira, New Line.
Responsável pela trilogia "O Senhor dos Anéis", a New Line tinha 600 empregados e produzia de 12 a 15 longas por ano. Agora, tem 50 funcionários e produz de seis a oito filmes. A Warner reduziu de 30 para 20 o volume anual de longas.
A concentração de mercado -com espaço para um número menor de títulos, que são dirigidos ao público jovem e ocupam cada vez mais salas- foi aprofundada pela escassez de crédito, mas está relacionada também a um modelo de negócio que, inicialmente configurado nos anos 70, favorece a circulação de superproduções juvenis.
Personagens importantes na consolidação do cinema independente norte-americano a partir dos anos 90 protagonizam episódios ilustrativos dos novos tempos. "Che", de Steven Soderbergh, que obteve simbólica Palma de Ouro em Cannes com "Sexo, Mentiras e Videotape" (1989), quase não encontrou distribuidor nos EUA.
Lançada discretamente com uma verba de promoção de US$ 1 milhão (contra a média atual de US$ 37 milhões para um filme de estúdio), a cinebiografia de Ernesto Guevara arrecadou apenas US$ 1,7 milhão. O novo projeto de Soderbergh, "Moneyball", foi suspenso três dias antes do início das filmagens.
Nesse caso, os dados são ainda mais alarmantes: era um filme de grande estúdio (Sony) e estrelado por um astro (Brad Pitt), mas foi considerado de alto risco porque envolvia o uso de um estilo semidocumental que não seria "vendável". Descontente com o desempenho de seus dramas adultos recentes, a Universal suspendeu as atividades do departamento responsável por esses projetos.
Os irmãos Bob e Harvey Weinstein -que tornaram a produtora e distribuidora Miramax, hoje incorporada ao grupo Disney, um ícone da onda independente nos anos 90- tentam agora erguer a Weinstein Company, que se reestrutura, com a ajuda do escritório que cuidou da falência da Enron, para renegociar dívida de US$ 500 milhões.
"É um período de desafios para todos os que não fazem filmes para crianças ou para adultos que se comportam como crianças", afirma Rebecca Yeldham, diretora do Festival de Los Angeles, cuja última edição, realizada em junho, reuniu profissionais da indústria em painel chamado "O mundo como o conhecemos: acabou?".
"Era inevitável que os anos de ouro do cinema independente terminariam. Como ocorreu de forma geral na economia dos EUA, a operação se tornou cheia de gorduras - muitos filmes sendo jogados no circuito, muitos filmes ruins "queimando" o espectador desavisado, custos crescentes."
O orçamento médio de um longa independente saltou de US$ 5 milhões "para duas ou três vezes mais", de acordo com Rebecca, e seus custos de lançamento subiram para "entre US$ 2 milhões e US$ 5 milhões", segundo o produtor Mark Gill, em virtude da necessidade de lutar pelo público contra superproduções e alternativas de lazer doméstico.
Ex-presidente da Miramax e atual diretor da produtora Film Department, Gill foi apelidado por colegas em Hollywood como "príncipe das trevas" por um diagnóstico sombrio do cenário independente feito em um simpósio do Festival de Los Angeles de 2008.
Na ocasião, Gill considerou que "o céu estava caindo" sobre a produção independente. "Quando fiz aquele discurso, fui acusado de ser muito negativo", lembra. "O tempo mostrou que eu fui otimista. As coisas ficaram um pouco piores do que eu havia imaginado."


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