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"O CASAMENTO DE LOUISE"
Comédia vence clichês com desenvoltura e consegue divertir
COLUNISTA DA FOLHA
A crítica mais implacável
não deixará de atentar para
alguns dos "defeitos" evidentes de
"O Casamento de Louise": humor
fácil, enredo esquemático, personagens caricatos, reforço de clichês discutíveis sobre a harmonia
social e racial no país etc.
Tudo isso tem seu tanto de verdade, mas uma comédia -não
sendo preconceituosa ou emburrecedora- deve ser avaliada antes de tudo por sua capacidade de
divertir o espectador. E o longa-metragem de estréia de Betse de
Paula tem essa capacidade.
A história é tola e descabelada
como convém a uma farsa popular, uma sátira de costumes, uma
chanchada (qualquer dessas definições se ajusta ao filme).
Louise (Sílvia Buarque), violinista separada de um banqueiro
corrupto (Murilo Grossi), convida para almoçar em sua casa, à
beira do lago Paranoá, em Brasília, o maestro sueco (Mark Hopkins) da orquestra em que toca,
de olho num possível romance.
O evento vira uma confusão federal por conta das intervenções
desastradas da empregada de
Louise, Luzia (a encantadora Dira
Paes), do ex-namorado desta, o
jogador de futebol Bugre (Marcos
Palmeira), e do ex-marido banqueiro da dona da casa -sem falar das crianças do casal.
Antes, durante e depois do almoço, desfilam gags e piadas envolvendo praticamente tudo o
que tem a ver com o cotidiano e o
imaginário do brasileiro na atualidade: corrupção, futebol, TV,
música popular, turismo, sexo.
O esquematismo inicial do argumento -o paralelo entre a
burguesa Louise e a proletária Luzia, o contraste entre popular e
erudito, violino e batucada, feijoada e salmão- vai dando lugar,
progressivamente, a descaminhos
inesperados e, principalmente, a
uma cada vez mais rara alegria de
filmar e de brincar.
A saudável desfaçatez do filme
chega ao ponto de fazer a rainha
Sílvia (Kristel Bianco), da Suécia,
comer a feijoada de Luzia, além de
mostrar um jogo de futebol na
Bolívia em que Bugre bate o escanteio, vai para a área e faz o gol.
Estamos aqui a anos-luz de certo cinema brasileiro que tenta ser
americano ou europeu, com resultados quase sempre pífios.
Rodado praticamente num único local -a casa de Louise e seu
entorno-, com uma câmera
muito livre e desenvolta, "O Casamento de Louise" dá a impressão
de ser um filme que todo mundo
se divertiu fazendo: o roteirista
José Roberto Torero, a diretora,
os atores, a equipe técnica.
Essa alegria contagiante, que revela uma integridade admirável,
justifica o filme e ajuda-o a vencer
todas as ressalvas.
(JOSÉ GERALDO COUTO)
O Casamento de Louise
Direção: Betse de Paula
Produção: Brasil, 2001
Com: Sílvia Buarque, Dira Paes, Marcos
Palmeira
Quando: a partir de hoje no Cine Arte
Liliam Lemmertz e no Espaço Unibanco
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