São Paulo, sexta-feira, 24 de agosto de 2001

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"O CASAMENTO DE LOUISE"

Comédia vence clichês com desenvoltura e consegue divertir

COLUNISTA DA FOLHA

A crítica mais implacável não deixará de atentar para alguns dos "defeitos" evidentes de "O Casamento de Louise": humor fácil, enredo esquemático, personagens caricatos, reforço de clichês discutíveis sobre a harmonia social e racial no país etc.
Tudo isso tem seu tanto de verdade, mas uma comédia -não sendo preconceituosa ou emburrecedora- deve ser avaliada antes de tudo por sua capacidade de divertir o espectador. E o longa-metragem de estréia de Betse de Paula tem essa capacidade.
A história é tola e descabelada como convém a uma farsa popular, uma sátira de costumes, uma chanchada (qualquer dessas definições se ajusta ao filme).
Louise (Sílvia Buarque), violinista separada de um banqueiro corrupto (Murilo Grossi), convida para almoçar em sua casa, à beira do lago Paranoá, em Brasília, o maestro sueco (Mark Hopkins) da orquestra em que toca, de olho num possível romance.
O evento vira uma confusão federal por conta das intervenções desastradas da empregada de Louise, Luzia (a encantadora Dira Paes), do ex-namorado desta, o jogador de futebol Bugre (Marcos Palmeira), e do ex-marido banqueiro da dona da casa -sem falar das crianças do casal.
Antes, durante e depois do almoço, desfilam gags e piadas envolvendo praticamente tudo o que tem a ver com o cotidiano e o imaginário do brasileiro na atualidade: corrupção, futebol, TV, música popular, turismo, sexo.
O esquematismo inicial do argumento -o paralelo entre a burguesa Louise e a proletária Luzia, o contraste entre popular e erudito, violino e batucada, feijoada e salmão- vai dando lugar, progressivamente, a descaminhos inesperados e, principalmente, a uma cada vez mais rara alegria de filmar e de brincar.
A saudável desfaçatez do filme chega ao ponto de fazer a rainha Sílvia (Kristel Bianco), da Suécia, comer a feijoada de Luzia, além de mostrar um jogo de futebol na Bolívia em que Bugre bate o escanteio, vai para a área e faz o gol.
Estamos aqui a anos-luz de certo cinema brasileiro que tenta ser americano ou europeu, com resultados quase sempre pífios.
Rodado praticamente num único local -a casa de Louise e seu entorno-, com uma câmera muito livre e desenvolta, "O Casamento de Louise" dá a impressão de ser um filme que todo mundo se divertiu fazendo: o roteirista José Roberto Torero, a diretora, os atores, a equipe técnica.
Essa alegria contagiante, que revela uma integridade admirável, justifica o filme e ajuda-o a vencer todas as ressalvas.
(JOSÉ GERALDO COUTO)

O Casamento de Louise    
Direção: Betse de Paula
Produção: Brasil, 2001
Com: Sílvia Buarque, Dira Paes, Marcos Palmeira
Quando: a partir de hoje no Cine Arte Liliam Lemmertz e no Espaço Unibanco



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