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PERSONALIDADE
Sem Cláudio Mamberti, perde-se um caráter
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
É impossível para mim não
falar de Cláudio Mamberti de
maneira pessoal. Conheci-o
quando buscava um ator para o
episódio "Uma Aula de Sanfona",
que estava para rodar em 1982.
Jamais esperava que um ator
conhecido como ele sequer topasse ler o roteiro de um filme a que
A.P. Galante, o produtor, deu o
nome, sem grande sutileza, "As
Safadas". E que seria feito em seis
dias, com cinco rolos de negativo:
coisa rapidíssima, baratíssima.
Cláudio não apenas topou, como entrou na história de cabeça.
Os dias eram árduos. Para completar, a filmagem acontecia em
um lupanar da avenida São João
em pleno funcionamento. Toda
manhã era preciso transformar o
bordel num apartamento onde viviam duas moças de classe média.
Cláudio não se impressionava
com isso. Nunca errou uma fala.
Desde o primeiro dia tinha seu
papel perfeitamente composto, o
que nunca o impediu de escutar
instruções como se fosse um iniciante, sem a menor arrogância.
Pelo contrário: quando não estava em cena, ajudava a segurar os
chiliques de uma das atrizes. Não
tivesse feito isso, é provável que a
filmagem não chegasse ao final.
A última vez que vi Cláudio
Mamberti foi quando, há dois
anos, o episódio foi exibido -depois de quase 20 anos sem cópia- na Semana dos Independentes do Espaço Unibanco. Ele
fez questão de comparecer à sessão, assumiu com alegria aquele
filme de pretensões modestas, fez
questão de ir na frente e relembrar
sua participação naquela história.
Disse a mim, em seguida, que tivera muita alegria em fazer aquele
trabalho. Falou também, com justificado entusiasmo, de seu projeto seguinte: dirigir uma peça inédita de Plínio Marcos, com seu irmão, Sérgio, como ator. O que levou, aliás, adiante. Cláudio prometeu me convidar para a estréia,
o que nunca fez. Toda vez que eu
cruzava com Sérgio, ia cobrar esse
esquecimento, o que, por algum
motivo, sempre adiava.
Por alguma razão, a fama de
Cláudio sempre ficou à sombra da
de Sérgio, como "o irmão de".
Uma evidente injustiça que não
desmerece, aliás, o grande talento
de Sérgio. A morte prematura de
Cláudio, aos 60 anos, ocorrida na
quarta-feira, dia 19 último, é uma
óbvia perda para o cinema, para o
teatro, para a televisão.
É também uma perda pessoal
inestimável: o mesmo vigor que
imprimia a seus personagens, a
mesma dedicação ao trabalho
transformavam-se longe dele
num espírito cheio de humor, vivacidade, capacidade de sonhar.
Fará, sim, grande falta, como ator
e como caráter.
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