|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
OPINIÃO
Beuys fez a obra mais apaixonante da atualidade
Artista alemão acreditava na utopia da arte coletiva e transformadora
GERALD THOMAS
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LONDRES
Duchamp mudou o mundo com pouquíssimas obras
e um bom manifesto.
No século 20 ainda era
possível pensar que arte mudaria o mundo.
O legado de Marcel Duchamp (1887-1968) é inegável e vive até hoje. O inventor
do "já inventado" (ready mades) nos conduziu para uma
arte mais fria, mais analítica:
a arte da demolição dos conceitos sagrados.
No caso de Joseph Beuys
(1921-1986), tem-se o cúmulo
da utopia: "A Universidade
Livre Internacional, o Projeto
Defesa da Natureza". Se Duchamp inventou a roda de bicicleta, Beuys faz o mesmo
com o vinho, cujas garrafas
tinham a sigla da "Universidade Livre Internacional".
Seus "múltiplos" tornaram-se os veículos de propaganda da "Organização pela
Democracia Direta por Plebiscito". Sim, há humor. A
questão é onde procurá-lo.
Duchamp deu em Andy
Warhol (1928-1987) e parou
na Alemanha, onde deparou-se com um enigma:
Beuys. Beuys foi também um
militar, um piloto e destruidor prático, e não somente de
conceitos. Pilotou aviões da
Luftwaffe até que foi abatido.
Dado como morto, acabou
saindo vivo da aeronave e,
caído na neve, foi enrolado
em banha e feltro. Sobreviveu. Claro que a sua "assinatura" no mundo acabou sendo a banha, o feltro, tudo
sempre embrulhado e com o
sinal da Cruz Vermelha.
"A Revolução Somos Nós"
ou "Arte=Capitalismo" (com
40 múltiplos e 20 vídeos), é a
maior retrospectiva de Beuys
no Brasil. São 250 obras de
um artista que acumulou
mais de 5.000 títulos. Mas como se julga um artista que fez
parte do Terceiro Reich e, décadas depois, foi aceito e
aclamado pelos EUA?
Suas performances como
"Eu Gosto da América e a
América Gosta de Mim", de
1974, deixam claro essa relação de amor e ódio: Alemanha x EUA. Não há como não
enxergar a arte pós-Duchampiana como política/humorística. A arte de Beuys é tão
política quanto a de Warhol.
Beuys é direto. Warhol
mais sutil. Beuys é um filósofo, pintor, escultor, antropósofo, um estudioso da história. Warhol, não.
Beuys acreditava na transformação social como "A"
grande obra humana, necessariamente coletiva e essencialmente plástica.
Warhol, americano, era
menos dogmático e disse que
"todos têm direito a 15 minutos de fama".
CARTAZES
Convenhamos: quem foi
piloto da Luftwaffe tem que
se reinventar, ou reinvent-arte. Dominador da palavra
concreta, (inseparável da
obra de Beuys), os cartazes
condensam e multiplicam a
visibilidade de toda sua criação. Aqui, nessa exposição,
vemos seu "arsenal de propaganda". A complexidade
de Beuys se resume em cartazes como "Conclamação à Alternativa", "Beuys Luta Boxe
pela Democracia Direta".
Ou pela capa da revista
Spiegel: " Joseph Beuys: O
Maior de Todos" com sua cara estampada em letras enormes. O artista fica ele mesmo
exposto ao ridículo.
"Interessa-me a distribuição de veículos físicos, porque me interessa difundir
ideias que contêm a radical
mudança política". Está aí
um artista alemão, no melhor e pior dos sentidos.
Não existe na história recente alguém cuja obra é tão
apaixonante: pode-se ficar lá
dentro dela tendo pesadelos
ou sonhos lindos.
Um dia, a arte e a política
se juntarão. Aliás, já se juntaram. A retórica quase circense dos chefes de Estado e a
nossa descrença perante
eles, finalmente, deram na
"Equação Beuys".
Será que todos nós teremos que pilotar aviões, ser
abatidos e cobertos por toucinho? O futuro não dirá!
GERALD THOMAS é diretor e autor teatral.
JOSEPH BEUYS - A
REVOLUÇÃO SOMOS NÓS
ONDE Galpão Sesc Pompeia
(r. Clélia, 93,
tel. 0/xx/11/ 3871-7700)
QUANDO de ter. a sáb., das 10h às
21h.; dom., das 10h às 20h; até
28/11
QUANTO entrada franca
Texto Anterior: Marcelo D2 expõe semelhanças com Bezerra da Silva Próximo Texto: Sesc lança caderno que discute embates da cultura Índice | Comunicar Erros
|