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"Antígone" perde o rito na atuação do elenco
da Reportagem Local
Para alguns autores, "Antígone" é a mais "cristã", por assim
dizer, das tragédias do grego Sófocles (c. 469-399 a.C.). É aquela em
que, por exemplo, a protagonista
mártir -que escolhe a lei divina
sobre a injusta lei humana- mais
se aproximaria de uma Joana
D'Arc. Em que ela se entrega confiante ao sacrifício.
O esforço de Antígone para sepultar o irmão Polinices, contra a
ordem de Creonte, rei de Tebas,
mas escudando-se na Justiça da lei
divina e "eterna", é de um heroísmo bastante reconhecível, familiar, até mesmo "atual".
Em tal visão, talvez não houvesse
uma tragédia clássica mais adequada a uma sociedade como a
brasileira. (Aliás, é mesmo das
poucas que alcançaram um lugar
definitivo na história das grandes
montagens do país.)
E é curioso agora como, na nova
montagem em cartaz no Tuca, a
tragédia de Sófocles é mencionada
como surpreendente "pela atualidade". Pelo enfrentamento do poder, da violência tirânica, escudando-se na Justiça.
Mas "Antígone" não vem com
uma roupagem cristã. Surge "antropofágica", com imensa confusão de referências rituais, deglutindo de tudo um pouco, à moda
de Oswald de Andrade.
Os rituais que vão se amontoando a cada cena, como se fossem
quadros de circo, têm origem africana, oriental, esotérica, indígena
brasileira, o que mais quiserem.
Cenografia e figurinos reportam-se em parte ao artista e louco
Arthur Bispo do Rosário. Antonin
Artaud é um outro norte.
Um tal amontoado de disparidades surge inesperadamente coeso,
pelas mãos do diretor Carlos Gardin, na cenografia, nos objetos de
cena, nas máscaras, nas coreografias. A tragédia clássica se revela no
espetáculo, quando são esses elementos que predominam.
Nem tanto, porém, na interpretação. Gardin não conseguiu injetar em seu elenco, quando em
atuação individual, a coesão alcançada entre o texto e sua encenação antropofágica. São atores,
ao que parece, ainda iniciantes,
inexperientes -e estranhamente
cerimoniosos, no mau sentido,
diante do grande texto clássico.
Em um ou outro momento, chegam a indicar proximidade, mas
perdem-se logo em declamação
vazia, formal.
Talvez por representar o personagem mais "humano" que é Ismene, Marisette Corrêa alcança algum relevo. O mesmo vale para
Adilson Estevam, que faz Tirésias.
É pouco, num espetáculo que,
pelo texto e pela "mise-en-scène",
bem permitiria um vôo de maior
liberdade e principalmente coragem na interpretação.
(NS)
Peça: Antígone
Com: Luce Diogo, Guilherme Jorge,
Leonardo Cortez e outros
Quando: sex e sáb, às 21h; dom, às 20h
Onde: Tuca Arena (r. Monte Alegre, 1.024,
tel. 011/873-3422)
Quanto: R$ 10
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