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São Paulo, quarta-feira, 24 de dezembro de 2003

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FOTOGRAFIA

Edinger reencontra memória afetiva na zona sul carioca

EDER CHIODETTO
EDITOR DE FOTOGRAFIA

Fotografar uma cidade como o Rio de Janeiro, transformada em cidade-cenário pelo excesso de imagens de seus ícones turísticos que circulam mundo afora, é tarefa das mais árduas para os fotógrafos. Ao encontrar um conceito e uma técnica original, o fotógrafo Claudio Edinger, 51, driblou essas dificuldades e realizou o livro "Rio", um dos bons lançamentos deste final de ano.
Nascido no Rio de Janeiro, Edinger logo se mudou para São Paulo com sua família. Em 76, foi para Nova York, onde ficou por 20 anos. Ao regressar, veio morar novamente em São Paulo. "O Rio de Janeiro, onde nasci e nunca vivi, passou a ser o idílio. Quando criança, passava as férias lá, na casa de uma tia. Morando fora, evitava ouvir bossa nova porque a saudade era uma tortura", diz.
Entre o exílio voluntário e o retorno ao país, Edinger se notabilizou por imprimir seus ensaios em livros, entre os quais se destacam "Chelsea Hotel" e "Venice Beach" (ambos vencedores do Leica Medal of Excellence nos EUA), além do impagável "Loucura", acerca do manicômio do Juqueri. "Rio" é seu décimo primeiro livro.
Ao adquirir uma câmera de formato 4 x 5 polegadas (10 x 12,5 cm), de difícil manuseio e normalmente utilizada em estúdio, Edinger aprimorou uma técnica que permite obter, no mesmo plano, zonas com e sem foco. "A 4 por 5 é uma filósofa da fotografia. Quando a gente fotografa, não tem como ver o que está sendo registrado. Ela permite que você a conduza até certo ponto, depois é como se fosse dotada de um poder de observação próprio", diz.
Se em livros anteriores Edinger fez documentários com enfoque mais clássico, nesse "Rio" o documental surge vitalizado por uma profunda imersão introspectiva.
O mundo e as pessoas não são necessariamente aquilo que parecem ser. A fração de realidade com que o artista trabalha é reconfigurada para se adequar ao seu estado de ânimo diante da paisagem. Paisagem, aqui, subentendida não como o cenário atual da cidade, mas sim como o espaço possível do reencontro com suas memórias. Nos melhores momentos de "Rio", Edinger brinca com a escala da cidade, que parece se tornar uma maquete, como na fotografia que mostra a região do shopping Rio-Sul. Banhistas por vezes se tornam gigantes, como a sensação de uma criança diante de um ser adulto.
A memória de um lugar é formada por imagens fugidias, sem contornos precisos. Lugar atemporal que guarda pouca ressonância do mundo real. A memória de um lugar é, em boa parte, invenção, imaginação criativa.
Reconstruir uma cidade a partir dos dados fragmentados dessa memória inventiva e, assim, trazê-la para a realidade das páginas de um livro foi o roteiro poético percorrido pelo fotógrafo, que fez com que sua estranha câmera captasse mais suas apreensões interiores que a paisagem diante dela. Documentário pessoal, porém, transferível.


Rio
    
Autor: Claudio Edinger
Editora: DBA
Quanto: R$ 90, em média (144 págs)
Exposição: de 5 a 18 de janeiro, de seg. a sex. das 10h às 20h; dom., das 10h às 16h
Onde: galeria Espaço Paul Mitchell (r. da Mata, 70, SP, tel. 0/xx/11/3079-0300)



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