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Pescador leva leitura a meninos internos
Léo do Peixe promove oficinas para entreter adolescentes que vivem no Cesap, centro correcional inaugurado perto de Pirapora
Com idades entre 15 e 16, internos preferem livros sobre sexo e drogas; diretora diz que é preciso "selecionar as leituras"
DO ENVIADO ESPECIAL A PIRAPORA
Se "Grande Sertão: Veredas"
fosse narrado hoje, é provável
que Riobaldo e Diadorim não se
encontrassem pela primeira
vez no rio São Francisco, quando ainda eram crianças, mas
num centro correcional de menores, vigiados 24 horas por
dia. "Pirapora era até muito recentemente o sexto município
mais violento do Estado de Minas", diz Dalva Antonia Maria
de Castro Galdino, advogada,
comerciante, idealizadora e diretora do recém-inaugurado
Centro Socioeducativo de Adolescentes de Pirapora, o Cesap,
onde Léo do Peixe organiza
uma oficina mensal de leitura.
Com 58 funcionários e capacidade para 20 internos (hoje,
são dez, entre 15 e 16 anos, acomodados em celas de quatro
cada uma), o Cesap é um caixote murado de cimento e arame
farpado, construído a poucos
quilômetros da cidade, isolado
na estrada para Montes Claros.
O projeto é resultado de uma
parceria entre o Estado, o município e empresários locais, todos assustados com a taxa de
criminalidade da região: "Todo
mundo quer saber por que eles
cometem o ato infracional", diz
a diretora.
Entre os internos, há quem
cometeu homicídio. Alguns
passaram pela cadeia pública. A
idéia do centro é tentar reinserir o menor na sociedade. Além
do banho de sol diário de uma
hora, os adolescentes freqüentam aulas de matemática, português e inglês, cursos profissionalizantes e oficinas.
Léo do Peixe leva os livros e
revistas de bicicleta. A maioria
dos meninos gosta de assuntos
que lhes dizem respeito diretamente, como sexo e drogas. "A
gente tem que selecionar as leituras", ressalva Dalva Galdino.
"Tem um que adora poesia", diz
o pescador.
As situações familiares são
dramáticas. "Tem menino de 15
anos que já é pai, com filho de 8
meses que ele nunca viu. E tem
pai que não consegue vir visitar
o filho preso. No início, ainda
permitíamos que levassem livros para as celas, até que um
adolescente tentou passar uma
coisa para outro, dentro da Bíblia. A gente percebeu e retirou
os livros. Ele mandava o outro
ler um determinado salmo. Era
um recado", diz a diretora. "Outro dia, um menino gritou para
mim no meio da rua. Era um
deles, que tinha sido solto", diz
Léo do Peixe, sem disfarçar a
felicidade.
(BERNARDO CARVALHO)
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