São Paulo, quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Temos de fazer um debate sem estrelismos"

José do Nascimento Júnior, diretor do Ibram, defende descentralização de recursos

Em entrevista, afirma que reforma na Lei Rouanet e novo fundo não terão um impacto "catastrófico" e sugere criação de museus


DA REPORTAGEM LOCAL

No centro das discussões sobre o futuro dos museus no país está um único homem. José do Nascimento Júnior, antropólogo social, é o diretor do Instituto Brasileiro de Museus. Está nas mãos dele, em grande parte, a missão de contentar grandes e pequenos museus do país. É criticado de um lado por não ser ligado às artes visuais. Mas recebe elogios, de outro, pela tentativa de organizar o setor de museus no país.
Em entrevista à Folha, no dia em que deu posse ao conselho do Ibram, Nascimento Júnior se defende de acusações de uso eleitoreiro da máquina do Ministério da Cultura, esclarece o conflito em torno dos modelos de gestão estaduais e afirma que o novo fundo para o setor de museus, aliado à reforma da Lei Rouanet, não terá efeito "catastrófico". Leia a seguir alguns trechos da conversa. (SILAS MARTÍ)

 

FOLHA - A maioria dos museus depende de recursos incentivados. A reforma na Lei Rouanet não vai zerar patrocínios e travar instituições?
JOSÉ DO NASCIMENTO JÚNIOR
- Esse teto de 80% aponta para um campo em que o incentivo não pode ser 100% para todas as áreas. As empresas têm de entrar com dinheiro bom, e eu não vejo a possibilidade de secar a fonte, porque a área de cultura dá uma visibilidade interessante às empresas. E a nova lei também cria uma série de fundos. Sempre há medo, mas o ministério vai estabelecer regras de transição. Não vai ocorrer um impacto catastrófico.

FOLHA - Não é utópica a ideia de descentralizar os recursos e financiar museus em todo o país?
NASCIMENTO JÚNIOR
- A concentração de instituições culturais no Brasil não passou da linha do Tratado de Tordesilhas, e o Brasil hoje é a sexta maior rede de museus do mundo. É importante entender que o museu é a unidade básica de memória. Há uma demanda real no país por mais museus. As pessoas também precisam enxergar o Brasil como um todo, não a partir de São Paulo ou do Rio. Tem que entender o país na sua complexidade e na sua profundidade.

FOLHA - Mas, nessa descentralização, grandes museus temem que vão perder recursos na divisão com milhares de instituições minúsculas.
NASCIMENTO JÚNIOR
- Os grandes vão ser tratados como grandes. As megaestruturas sempre foram muito bem tratadas em detrimento das pequenas. Nunca foi o contrário, até porque a visibilidade foi sempre em direção aos grandes. Precisamos ampliar o número de recursos, não ficar numa linha do meu pirão primeiro. Temos que tratar em cada âmbito. Governos estaduais e municipais também têm de ter suas políticas.

FOLHA - Essa nova estrutura, no entanto, não pode dar margem ao uso eleitoreiro da máquina estatal?
NASCIMENTO JÚNIOR
- Se a gente fosse eleitoreiro, estaria investindo onde tem concentração de voto, mas estamos mostrando que o Brasil é mais complexo do que essas regiões. Quem for ao Brasil profundo dialogar com Estados como o Piauí, Maranhão, Acre, Roraima vai ver que tem necessidades que a estrutura que nós herdamos do Ministério da Cultura não nos permitia atender. Nós refundamos o ministério e hoje ele é uma estrutura garantidora do direito cultural.

FOLHA - Como será resolvido o impasse em nível estadual, com organizações sociais com diretores que não podem ser remunerados, de acordo com o Estatuto de Museus?
NASCIMENTO JÚNIOR
- É um equívoco interpretar o estatuto como sendo restritivo a isso. Se você pegar três, quatro juristas, cada um vai dar um parecer diferente sobre isso. São Paulo não necessita fazer disso um cavalo de batalha. Estamos caminhando para regulamentar. Temos de fazer esse debate com tranquilidade, sem estrelismos ou visões apaixonadas.

FOLHA - Mas esse esquema em nível estadual mais a estrutura federal não leva a um possível inchaço da máquina estatal, como no Ibram?
NASCIMENTO JÚNIOR
- Não temos uma megaestrutura. São 40 cargos. O restante deles foi criado para reforçar a estrutura dos museus federais. São 470 pessoas, funcionários públicos de carreira. E vamos ter concurso agora para 260 funcionários, parte em Brasília e parte deles nos museus federais.


Texto Anterior: Racha de museus
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.