São Paulo, sexta-feira, 25 de janeiro de 2002

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Pop ermitão

Dos mais elogiados cantores saídos do Canadá, Rufus Wainwright fala da música do país e de seu novo CD, "Poses"

CLAUDIA ASSEF
DA REPORTAGEM LOCAL

No divertido filme "South Park", de 99, mães americanas declaram guerra ao Canadá. Para minar qualquer influência vinda daquele país, colocam fogo em "porcarias canadenses". Lá se vão discos de Celine Dion e Bryan Adams. Ponto para as tiazinhas do desenho.
Mas o que elas não dizem em "South Park" é que o Canadá também tem música boa. De lá saíram nomes como Neil Young, k.d. lang, Leonard Cohen e, agora, o cantor e compositor Rufus Wainwright, 28.
Com o segundo CD, "Poses", que chega agora ao Brasil, Wainwright tornou-se o nome quente do pop do Canadá, segundo maior país do mundo e uma das piores distribuições demográficas do planeta.
Os 30 milhões de habitantes se espremem em algumas centenas de quilômetros no sul do país, a região mais quente. Boa parte do Canadá é quase inabitada.
Segundo Wainwright, essas são condições ideias para criar bons músicos. "O Canadá é historicamente um país produtor de boa música. Deve ser por causa do frio e de um certo isolamento", disse à Folha, por telefone, de Los Angeles (EUA). Leia a seguir a entrevista com o músico.

Rufus Wainwright - Estou tão feliz de estar dando uma entrevista para o Brasil.

Folha - Que bom. Onde você está?
Wainwright -
Em Los Angeles. Está um frio horrível e estou cercado de gente estranha. Queria estar aí curtindo o verão.

Folha - Ou no Canadá, talvez?
Wainwright -
Adoro o Canadá. Nasci nos EUA, mas gosto de falar que sou de Montréal. Na verdade, fui criado no Canadá, mudei para lá aos três anos de idade. Isso faz de mim um canadense legítimo.

Folha - Você vê o Canadá de alguma forma na sua música?
Wainwright -
Com certeza. Acho que o Canadá é historicamente um país produtor de boa música. Deve ser por causa do frio e de um certo isolamento. Você fica sem ter muito o que fazer, a não ser tocar ou ouvir música. Essa energia canadense está na minha música.

Folha - E quem são seus ídolos no Canadá?
Wainwright -
Com certeza Leonard Cohen, hummm, Leonard Cohen e... Leonard Cohen (risos).

Folha - A cena roqueira do Canadá também anda agitada. Você tem acompanhado?
Wainwright -
Eu não saberia, continuo sendo um fã de ópera, é o que ouço basicamente. Se bem que tenho sentido um agito maior na música, sim. Acho que uma coisa legal sobre o Canadá é que lá os músicos não sentem tanta pressão. Você não tem que vender um monte de discos. Por um lado, isso faz com que muitos grupos se acomodem e se tornem preguiçosos. Mas, de uma maneira geral, é positivo, porque a obrigação de fazer muito sucesso pode matar.

Folha - Seus pais são cantores de folk. Você não teve muito como escapar da música, não?
Wainwright -
Minha mãe me conta que quando eu era um bebezinho, comecei a balbuciar as primeiras músicas enquanto ela cantava...

Folha - Sua primeira influência musical foi sua mãe?
Wainwright -
Como imagem, sim. Mas minha primeira paixão musical foi Al Jonson [cantor e ator norte-americano morto em 1950". Sei que não é politicamente correto [Jonson aparecia nos filmes com o rosto pintado de preto"... adorava também Judy Garland, Edith Piaf. Só bem mais tarde fui ouvir Beatles, Eurythmics... Mas, acima de tudo, sou fanático por ópera desde os 13 anos.

Folha - Você ouvia discos da sua mãe?
Wainwright -
Sempre odiei a ópera. Até que eu tive uma experiência quase que religiosa... e foi isso que me chamou para a ópera.

Folha - O que aconteceu?
Wainwright -
Tinha 13 anos, e a vida estava começando a ficar muito difícil. Foi a época em que decidi "sair do armário"... mas havia a Aids, assustando todo mundo. Acho que a ópera funcionou como um alento.

Folha - Você era fã de Jeff Buckley [cantor e compositor americano morto por afogamento em 97"? É comum ser comparado a ele?
Wainwright -
Já ouvi essa comparação na França. É engraçado você ter dito isso porque acabo de fazer uma música sobre o Jeff. Mas não vou falar muito sobre ela ainda. Só digo que é sobre mim e Jeff. Odiava Jeff Buckley quando ele era vivo. Tinha ciúmes dele. Ele era superpopular... Uns dois meses antes de ele morrer nos encontramos em Nova York. Saímos juntos, tomamos um porre e acabamos ficando amigos. Fiquei impressionado com a delicadeza dele... E eu pensava que ele seria um cara supermetido. Quando ele morreu [afogado no rio Mississippi" fiquei arrasado. Acho que somos bem diferentes. Mas me sinto honrado pela comparação.

Folha - Seu disco "Poses" entrou na lista de vários críticos como um dos melhores de 2001. Você o colocaria na sua lista?
Wainwright -
Sim! Fiquei lisonjeado com isso. Mas não foi à toa. Ali tem muito trabalho duro, dei o sangue mesmo. Foi muito doloroso de fazer. No disco, sou um super-homem, indestrutível.

Folha - Há influências de bossa nova no disco, não?
Wainwright -
Yeah! Adoro, adoro! É a melhor música do mundo. Amo Jobim. Acho que jazz brasileiro é a música mais complicada e a mais simples do mundo ao mesmo tempo. Quero ir para o Brasil urgentemente.



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