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Pop ermitão
Dos mais elogiados cantores saídos do Canadá, Rufus Wainwright fala da música do país e de seu novo CD, "Poses"
CLAUDIA ASSEF
DA REPORTAGEM LOCAL
No divertido filme "South
Park", de 99, mães americanas declaram guerra ao Canadá. Para
minar qualquer influência vinda
daquele país, colocam fogo em
"porcarias canadenses". Lá se vão
discos de Celine Dion e Bryan
Adams. Ponto para as tiazinhas
do desenho.
Mas o que elas não dizem em
"South Park" é que o Canadá
também tem música boa. De lá
saíram nomes como Neil Young,
k.d. lang, Leonard Cohen e, agora,
o cantor e compositor Rufus
Wainwright, 28.
Com o segundo CD, "Poses",
que chega agora ao Brasil, Wainwright tornou-se o nome quente
do pop do Canadá, segundo
maior país do mundo e uma das
piores distribuições demográficas
do planeta.
Os 30 milhões de habitantes se
espremem em algumas centenas
de quilômetros no sul do país, a
região mais quente. Boa parte do
Canadá é quase inabitada.
Segundo Wainwright, essas são
condições ideias para criar bons
músicos. "O Canadá é historicamente um país produtor de boa
música. Deve ser por causa do frio
e de um certo isolamento", disse à
Folha, por telefone, de Los Angeles (EUA). Leia a seguir a entrevista com o músico.
Rufus Wainwright - Estou tão feliz de estar dando uma entrevista
para o Brasil.
Folha - Que bom. Onde você está?
Wainwright - Em Los Angeles.
Está um frio horrível e estou cercado de gente estranha. Queria estar aí curtindo o verão.
Folha - Ou no Canadá, talvez?
Wainwright - Adoro o Canadá.
Nasci nos EUA, mas gosto de falar
que sou de Montréal. Na verdade,
fui criado no Canadá, mudei para
lá aos três anos de idade. Isso faz
de mim um canadense legítimo.
Folha - Você vê o Canadá de alguma forma na sua música?
Wainwright - Com certeza. Acho
que o Canadá é historicamente
um país produtor de boa música.
Deve ser por causa do frio e de um
certo isolamento. Você fica sem
ter muito o que fazer, a não ser tocar ou ouvir música. Essa energia
canadense está na minha música.
Folha - E quem são seus ídolos no
Canadá?
Wainwright - Com certeza Leonard Cohen, hummm, Leonard
Cohen e... Leonard Cohen (risos).
Folha - A cena roqueira do Canadá também anda agitada. Você
tem acompanhado?
Wainwright - Eu não saberia,
continuo sendo um fã de ópera, é
o que ouço basicamente. Se bem
que tenho sentido um agito maior
na música, sim. Acho que uma
coisa legal sobre o Canadá é que lá
os músicos não sentem tanta
pressão. Você não tem que vender
um monte de discos. Por um lado,
isso faz com que muitos grupos se
acomodem e se tornem preguiçosos. Mas, de uma maneira geral, é
positivo, porque a obrigação de
fazer muito sucesso pode matar.
Folha - Seus pais são cantores de
folk. Você não teve muito como escapar da música, não?
Wainwright - Minha mãe me
conta que quando eu era um bebezinho, comecei a balbuciar as
primeiras músicas enquanto ela
cantava...
Folha - Sua primeira influência
musical foi sua mãe?
Wainwright - Como imagem,
sim. Mas minha primeira paixão
musical foi Al Jonson [cantor e
ator norte-americano morto em
1950". Sei que não é politicamente
correto [Jonson aparecia nos filmes com o rosto pintado de preto"... adorava também Judy Garland, Edith Piaf. Só bem mais tarde fui ouvir Beatles, Eurythmics...
Mas, acima de tudo, sou fanático
por ópera desde os 13 anos.
Folha - Você ouvia discos da sua
mãe?
Wainwright - Sempre odiei a
ópera. Até que eu tive uma experiência quase que religiosa... e foi
isso que me chamou para a ópera.
Folha - O que aconteceu?
Wainwright - Tinha 13 anos, e a
vida estava começando a ficar
muito difícil. Foi a época em que
decidi "sair do armário"... mas havia a Aids, assustando todo mundo. Acho que a ópera funcionou
como um alento.
Folha - Você era fã de Jeff Buckley
[cantor e compositor americano
morto por afogamento em 97"? É
comum ser comparado a ele?
Wainwright - Já ouvi essa comparação na França. É engraçado
você ter dito isso porque acabo de
fazer uma música sobre o Jeff.
Mas não vou falar muito sobre ela
ainda. Só digo que é sobre mim e
Jeff. Odiava Jeff Buckley quando
ele era vivo. Tinha ciúmes dele.
Ele era superpopular... Uns dois
meses antes de ele morrer nos encontramos em Nova York. Saímos juntos, tomamos um porre e
acabamos ficando amigos. Fiquei
impressionado com a delicadeza
dele... E eu pensava que ele seria
um cara supermetido. Quando ele
morreu [afogado no rio Mississippi" fiquei arrasado. Acho que
somos bem diferentes. Mas me
sinto honrado pela comparação.
Folha - Seu disco "Poses" entrou
na lista de vários críticos como um
dos melhores de 2001. Você o colocaria na sua lista?
Wainwright - Sim! Fiquei lisonjeado com isso. Mas não foi à toa.
Ali tem muito trabalho duro, dei o
sangue mesmo. Foi muito doloroso de fazer. No disco, sou um super-homem, indestrutível.
Folha - Há influências de bossa
nova no disco, não?
Wainwright - Yeah! Adoro, adoro! É a melhor música do mundo.
Amo Jobim. Acho que jazz brasileiro é a música mais complicada
e a mais simples do mundo ao
mesmo tempo. Quero ir para o
Brasil urgentemente.
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