UOL


São Paulo, sábado, 25 de janeiro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LIVRO/LANÇAMENTO

"O MASSAGISTA MÍSTICO"

Obra satiriza mazelas culturais de Trinidad

Naipaul faz rir de sua terra em seu romance de estréia

MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA

N ão deveriam causar espanto as recentes polêmicas criadas por V.S. Naipaul em relação aos muçulmanos da Indonésia e do Paquistão - ou as anteriores, quando ele falou da Índia de seus antepassados. Desde "O Massagista Místico" (57), o Nobel se dedica a baixar o sarrafo nas mazelas políticas e no atraso cultural das antigas colônias européias.
Nesse seu primeiro romance, o alvo é a comunidade indiana que vive em seu país natal, Trinidad. País? Conforme Naipaul já vitupera na introdução: "Embora os políticos tenham se acostumado a chamá-la de país, Trinidad não passa de uma pequena ilha, que em tamanho não supera Lancashire e em população é pouco menor que Nottingham".
É lá, nos anos 1940, que se desenrola a história de Ganesh Ramsumair -de professor hesitante a massagista fracassado, de místico de araque a político populista. Sem talento, o jovem brâmane tira proveito da ignorância da população, que se deixa ludibriar por "massagistas pouco qualificados e dentistas charlatões". Ele limita-se a acenar para as centenas de livros que leu, a dizer que o paciente não tem nada de errado e a receitar beberagens inócuas.
De massagista a místico é um pulo, embora os frutos só comecem a ser colhidos depois que ele exorciza um menino que acreditava ser perseguido por uma nuvem negra. A cena do esconjuro atinge tons pungentes e cômicos, com direito a cânticos frenéticos em hindi, explosões e desmaios.
Ganesh também sonha em ser escritor, numa época em que se confunde talento literário com obra impressa, livro publicado com triunfo social. De início rejeitado, seu almanaque "101 Perguntas e Respostas sobre a Religião Hindu", torna-se o primeiro best-seller da ilha depois que a história da cura se espalha.
A graça de "O Massagista Místico" tende a diminuir com a ascensão de Ganesh, na medida em que o narrador se distancia do personagem para descrever as intrigas políticas. Mesmo assim, há cenas hilariantes envolvendo a sua curta carreira de jornalista e o jantar que o governador oferece aos broncos legisladores de Trinidad.
Tais episódios, associados a tipos impagáveis, como a tia apelidada de Grande Arrotadora, o sogro ladino Ramlogan, a intrigante esposa Leela e o livreiro de pés descalços Bissoon, garantem o interesse e o poder de fogo dessa sátira caribenha.


O Massagista Místico
    Autor: V. S. Naipaul Editora: Companhia das Letras Quanto: R$ 30,50 (224 págs.)




Texto Anterior: Rodapé: Virtudes e vícios educacionais transparecem no perfil das nações
Próximo Texto: "A Vida Íntima das Palavras": Escritor utiliza etimologia para criar abecedário de curiosidades
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.