São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2004

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MÔNICA BERGAMO

Operárias padrão

Operárias padrão

Greg Salibian/Folha Imagem
Ana Claudia Michels, que hoje é da categoria "special plus", despontou para a fama depois de participar de um desfile do estilista americano Marc Jacobs


Alívio geral nos bolsos das modelos da São Paulo Fashion Week. A semana de moda paulistana, que começa na próxima quarta-feira e reúne mais de 40 estilistas no maior evento fashion do país, reservou uma surpresa para as operárias da moda.

Sem aumento de "salário" há mais de três anos (período em que os cachês não foram reajustados), elas conseguiram acréscimos de até 30% nessa temporada. Os cachês mais baixos passaram de R$ 300, por desfile, para R$ 400, por exemplo.

"Foi um reajuste mínimo, na verdade", reconhece Cristine Franco, booker internacional da agência Marilyn. "Mas elas se sentem bem, valorizadas."

O "dissídio" foi decidido na semana passada, num acordo entre agências, a organização da SP Fashion Week e os estilistas -que pagam a conta. Assim, o cachê das modelos "C" passou para R$ 400, as "B" passaram a receber R$ 600, as "A", R$ 800, as "special", R$ 1.300, e as "special plus", R$ 5.000 -ou mais.

"Tudo é a lei da oferta e da procura. É como se elas fossem mercadorias", diz Eli Wahbe, dono da agência Mega. Modelos menos conhecidas são menos procuradas e, obviamente, recebem menos, ainda que tenham um trabalho de qualidade.

Fernanda Quilici, 14, está começando a vida nas passarelas e ainda é "C". Há seis meses ela está trabalhando praticamente de graça. É que, ao entrar na Marilyn, ela contraiu uma dívida com a própria agência para fazer um book de fotos. Algo como R$ 600. Teve que fazer vários trabalhos para pagar. Mas novas dívidas foram feitas.

Ela até hoje tem uma conta devedora -e nunca embolsa tudo o que recebe. Foi o caso do cachê de R$ 160 do Amni Hot Spot, usado para saldar débitos. Fernanda nem liga. Diz que "até pagaria" para desfilar, por exemplo, para o estilista Alexandre Herchcovitch.

Fernanda passou a semana fazendo regime para a SPFW -estava com 90 cm de quadril e tinha que ficar com 89 cm. Ela é uma das "new faces" do evento e uma das grandes promessas, ao lado de garotas como Letícia Santos, 14, da IMG, que tem 1,78 m, 52 quilos, 85 de busto -e os tão desejados 89 de quadril.

A piauiense Schnayder, 15 -seu nome é uma homenagem à atriz austríaca Romy Schneider-, da Elite carioca, já subiu um degrau na escada da moda e hoje é "B". Na semana passada, desfilou no Rio. Já posou para a revista "Capricho" e tem contrato com o shopping Iguatemi. Fazer uma campanha internacional, ainda que modesta, é a senha para subir mais um degrauzinho -e Schnayder sonha com isso. "Quero ir para o exterior e voltar bombando", diz.

Larissa Castro, 16, da Mega, fez isso. Ela ganhou em 2001 o concurso Riachuelo Mega Models. Mudou para Nova York, fez algumas campanhas -e já conseguiu chegar à letra "A". Recebe cachê de R$ 800 por desfile no Brasil -no exterior, já desfilou por US$ 1.500. "Ela já ganhou US$ 350 mil em dois anos", diz Eli, da Mega, um tanto entusiasmado: a própria Larissa diz que amealhou US$ 100 mil -mas teve que deixar a metade de tudo no caixa da agência. Vive na rua 38 com a 2ª avenida com a mãe, Luciane, num estúdio de quarto e cozinha, pelo qual paga US$ 1.800 por mês. Largou os estudos e começou a aprender inglês. Achou a mensalidade cara (US$ 400/mês) e desistiu para aprender a língua sozinha, "na marra".

Christiane Müller, 15, outra promessa da SPFW, também já é "A". "Ela é nossa desde os 12 anos", diz Cristine Franco, booker internacional da Marilyn. A modelo foi descoberta em Agudo (RS) e passou a ser acompanhada pela agência. Nesses três anos, vinha sempre a SP passar por uma espécie de vistoria. "Acompanhamos como ela estava se desenvolvendo, se estava crescendo." Em setembro de 2003, chegou a hora: Christiane foi para Milão, Paris, NY. "Por isso passou de "C" para "A" tão rápido", diz Cristine.

Para Mayana Moura, um dos destaques da Fashion Rio na semana passada, "é só fazer uma campanha grande que vira special", categoria que vem depois da "A" e onde ela está agora. Mayana teve sorte: começou direto como "special" depois de conhecer o fotógrafo peruano Mario Testino numa festa no Rio, em 2001. Ele a convidou para um editorial da "V", um "filhote" da prestigiada "Visionnaire". As fotos de Mayana punk nas areias escaldantes de Ipanema correram o mundo. Ela fez campanhas da Chanel e Ferragamo e, no Brasil, pulou os primeiros degraus -C, B e A.

Testino foi também o padrinho de Ana Claudia Michels. Veterana, ela pode ganhar US$ 30 mil em desfiles em temporadas no exterior. Na SP Fashion Week, atingiu o topo: recebe R$ 5.000 por desfile. No começo da carreira, Ana Claudia passou três anos "camelando" em NY, sem nem ser recebida nas agências. Acabou fazendo um desfile para Marc Jacobs, deixou Testino encantado e touché: "As portas da Europa se abriram para mim", diz. Logo depois outro fotógrafo, Steven Meisel, a convidou para um editorial na "Vogue" Itália. "Antes mesmo de ser fotografada, minha agência botou meu salário lá em cima", diz. E lá em cima ele permanece.



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