São Paulo, sexta-feira, 25 de fevereiro de 2000


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O melhor filme do ano

Divulgação
A atriz Mena Suvari, uma das "belezas americanas" do filme de Sam Mendes que estréia hoje, em cena de sonho do personagem interpretado por Kevin Spacey



Estréia hoje "Beleza Americana", de Sam Mendes, com Kevin Spacey e Annette Bening; produção concorre a oito Oscar (entre eles filme, diretor, ator e atriz)


SÉRGIO DÁVILA
Editor da Ilustrada

Beleza americana é o nome de uma rosa vermelha, linda à distância, mas com uma característica que a diferencia das demais: não tem cheiro. "Beleza Americana" (American Beauty) é também o nome do primeiro filme do diretor teatral Sam Mendes, 34, que estréia hoje no Brasil.
Conta a história de Lester Burnham (Kevin Spacey), que vive num sufocante subúrbio americano, trabalha há 14 anos numa revista sem graça, onde está prestes a perder o emprego, é dominado pela mulher, uma corretora de imóveis com quem não faz sexo (Annette Bening), cobiça a melhor amiga da filha (Thora Birch, de "Jogos Patrióticos", a filha, e Mena Suvari, de "American Pie", a amiga, que ilustra esta página) e tem como auge do dia o banho matutino, em que invariavelmente se masturba.
Tudo isso vai mudar, e Lester vai morrer. Não, desta vez a Ilustrada não está contando o final do filme. É o próprio Lester quem diz, na primeira cena: "Esta é a minha cidade, este é o meu bairro e esta é a minha rua. Tenho 42 anos e em menos de um ano estarei morto. Naturalmente, ainda não sei disto. De qualquer maneira, já estou mesmo meio morto".
Sua vida é bela, mas insípida, como a flor do título. Num dado momento, no primeiro terço do filme, sua filha vê um carro funerário passar. Nessa hora, o filme enterra a ordem estabelecida e Lester vira um rebelde quarentão.
Pede demissão do emprego, compra um Mustang conversível, arruma trabalho numa lanchonete fast food, volta a fumar maconha e ouvir Pink Floyd e começa a malhar. Tem agora um objetivo na vida: transar com a melhor amiga da filha, aquela patricinha bonita e meio vadia.
Envolve-se ainda com o filho dos vizinhos, cinegrafista amador, traficante e filho de um milico conservador, que acaba se envolvendo com a filha dele e protagoniza um dos mais belos momentos de "Beleza", em que ficamos alguns segundos assistindo à filmagem que ele faz de um saco plástico sendo levado pelo vento.
"Beleza Americana" desconstrói o "american way" sem piedade e com estocadas certeiras de sarcasmo. É uma mistura bem-sucedida de "Felicidade", de Todd Solondz, com "Engraçadinha", de Nelson Rodrigues. Tem pedofilia, masturbação e drogas.
E concorre no próximo dia 26 de março a oito Oscar, inclusive às importantes categorias melhor filme, diretor, ator (Spacey) e atriz (Bening). É a obra com mais indicações em 2000. Se levar algum, será mais mérito de Hollywood que demérito do filme.
Sam Mendes, britânico de origem portuguesa, é prodígio no meio teatral britânico. Comandou a Royal Shakespeare Company aos 25 anos e dirigiu a polêmica montagem "The Blue Moon", que entre outros méritos revelou a bunda de Nicole Kidman às platéias londrinas, onde sua atuação foi definida como "viagra", e ganhou a Broadway.
O diretor Steven Spielberg assistiu à sua versão de "Cabaret" e, empolgado, convidou-o a dirigir um filme por sua DreamWorks. Mendes aceitou e conseguiu fazer aquilo que prometíamos fazer na faculdade: incomodar o sistema dentro do sistema.
Mendes leva o pascácio que é o norte-americano médio ao cinema, com seu galão de 12 decalitros de coca-cola e seu contêiner de pipocas, faz com que ele se sente nas cadeiras e leve essa porrada no meio da cara -e goste de rir de si mesmo, pois o filme concorre ao Oscar e tem atores de primeira.
Como no personagem da crônica de Luis Fernando Verissimo que inventa o slogan perfeito para o uísque Chivas Regal ("Chivas Regal. O chivas dos uísques."), senta-se numa cadeira com um meio sorriso nos lábios e nunca mais cria nada, pois havia atingido o auge da perfeição e o resto seria necessariamente decadência e dor, o diretor Sam Mendes não precisa mais trabalhar. "Beleza Americana" vale por uma vida.
Não fosse por isso, o filme vale ainda por algumas cenas pontuais, como a que Annette Bening protagoniza no motel, com auxílio de um travesseiro e muito grito. Ou a poesia vazia da cena do saco descrita acima. Ou a briga entre filho traficante e pai truculento, um telão de pano de fundo.
É "Beleza Americana", mas poderia ser o verbete "Sonho Americano, Fim do" no dicionário da vida. É o melhor filme do ano. E ainda estamos em fevereiro.


Avaliação:     

Filme: Beleza Americana (American Beauty) Direção: Sam Mendes Produção: EUA, 1999 Com: Kevin Spacey, Annette Bening Onde: a partir de hoje, nos cines Astor, Morumbi 2 e circuito

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