São Paulo, sexta-feira, 25 de fevereiro de 2000


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Produção brinca com "ideal de perfeição" dos EUA, diz Spacey

LUCIANO VIANNA
especial para a Folha em Londres

Indicado para o Oscar de melhor ator por sua interpretação de Lester Burnham, Kevin Spacey, que já ganhou o Oscar de melhor ator coadjuvante em 1996 por seu papel no filme "Os Suspeitos", conversou com a Folha, após a estréia européia do filme, em Londres. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - Você já tinha tido vivido em algum subúrbio como o retratado em "Beleza Americana"? Como isso influenciou a construção do seu personagem?
Kevin Spacey -
Eu fui criado em diversos subúrbios de Los Angeles, mas minhas experiências sobre o casamento foram bem diferentes da de Lester. Meus pais foram casados por 44 anos e eram extraordinariamente felizes. Eu não tinha uma visão tão desordenada da vida como ele, mas eureconheço algumas coisas.

Folha - Como foi trabalhar com um diretor iniciante no cinema, como Sam Mendes?
Spacey -
Foi excelente. Eu tenho uma sorte muito grande com diretores iniciantes. A grande maioria de scripts que chegam para mim de iniciantes é bem mais original e inventiva do que os de diretores já consagrados. No primeiro filme, todo diretor gosta de tentar coisas novas, quebrar as regras, e para um artista isso é excelente, porque dá mais liberdade para trabalhar o seu personagem.
Quando nos encontramos pela primeira vez para discutir o script, soubemos que teríamos de trabalhar juntos. Nossas interpretações eram iguais e nos identificamos bastante um com o outro.

Folha - Na sua opinião, o que "Beleza Americana" significa?
Spacey -
É um nome prático para o filme, porque dá margem a várias explicações. Muita gente não sabe, mas existe uma rosa com esse nome nos EUA. Outra explicação é que o nome dentro do contexto do filme brinca um pouco com esse sonho de perfeição dos americanos, de achar que tudo é belo no dia-a-dia.

Folha - Onde você acha a beleza no dia-a-dia?
Spacey -
Eu não consigo achar beleza permanentemente no meu dia-a-dia. Há momentos bonitos e outros não.
Eu acho beleza em ficar olhando o meu cachorro por horas brincando no jardim. Acho que não importa o que você faça na sua vida, mas o importante é você tentar ver a beleza que existe nas pequenas coisas.
Em "Beleza Americana", todos os personagens acham que conhecem uns aos outros, mas estão enganados. Ninguém é aquilo que parece.

Folha - Você acha que esse filme é um retrato dos anos 90 nos Estados Unidos?
Spacey -
Não, eu acho que o filme é o retrato de duas famílias que, por acaso, moram nos EUA. Acho que, se essas famílias vivessem em Berlim, Londres ou Paris, as emoções e os relacionamentos que cada um dos personagens tem com sua respectiva família e com eles mesmos seria igual.
Não é exatamente uma visão do american way of life e, sim, de todos nós, de como estamos cada vez mais interiormente fechados e de como não nos comunicamos com os que estão ao nosso lado.

Folha - O filme mostra um mundo de mentiras.
Spacey -
Para mim, ele mostra como é fácil a gente viver ao lado de alguém e não conhecê-lo de verdade. Como é fácil você fazer uma imagem de alguém e seguir essa imagem por anos e anos, sem parecer notar que as pessoas crescem, mudam e que isso é normal.
O filme não traz nenhuma resposta, mas tenta examinar o que acontece no interior da vida das pessoas, das famílias atualmente.

Folha - Em algum momento você sentiu alguma pressão por estar fazendo um filme com um estreante para um grande estúdio como o DreamWorks?
Spacey -
Eu adorei que um grande estúdio tenha dado o seu aval para o filme, porque isso cria um exemplo para que os outros o sigam. Não há como negar que se trata de um filme inusitado para um grande estúdio, mas, durante toda a filmagem, nunca houve pressões para tornar o filme mais comercial ou coisas do tipo.

Folha - Como você escolhe os seus papéis?
Spacey -
Quando eu fiquei conhecido, em 95, foi por causa de três filmes que apareceram num intervalo de seis meses. Em todos eles eu fazia personagens frios, assustadores, e isso começou a influir muito na visão que as pessoas passaram a ter de mim. Nem parecia que eu já tinha trabalhado 17 anos no teatro e cinema, onde interpretei papéis muito mais parecidos com o Lester.
É da natureza humana você achar que uma pessoa é do jeito que você a viu pela primeira vez. Então, para muita gente, eu só ia me dar bem fazendo papéis de bandidos psicopatas ou assassinos calculistas.
Chegou uma fase em que eu resolvi mudar isso, não queria só fazer papéis de pessoas más pelos próximos dez anos. Então comecei um processo para me mover em outra direção, fazer personagens mais ambíguos e, hoje em dia, acho que já sou reconhecido como um ator que pode fazer diversos tipos de personagens.


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