São Paulo, quarta-feira, 25 de fevereiro de 2004

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ANÁLISE

BBC aponta saídas para o modelo estatal

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Guardadas as devidas proporções, duas crises televisivas estimulam o debate sobre o papel e a estrutura da TV pública nos dias que correm. O caso da BBC pode ajudar a pensar o caso da TV Cultura.
A independência da emissora pública britânica na cobertura da participação do país na Guerra do Iraque gerou confronto com o governo de Tony Blair. Embora a justificativa oficial para a guerra nunca tenha sido provada, na ofensiva, o governo pretende enfraquecer a emissora.
A independência da BBC está inscrita na forma de financiamento e no modelo administrativo adotados. Mantida pela receita proveniente de uma taxa paga por todos os proprietários locais de aparelhos televisivos, a rede pública inglesa conta com a simpatia do público.
A emissora, inicialmente acostumada ao monopólio que o regime estatal garantia, soube se adaptar à concorrência da iniciativa privada. Sem perder a ênfase em um diferencial anti-sensacionalista, a rede leva em conta índices de audiência.
A combinação de qualidade com sensibilidade para a interlocução com o telespectador resultou em um poderoso organismo híbrido. A rede britânica expandiu suas atividades, entrou na era digital, se preocupou com novas mídias, desenvolveu a penetração de seu noticiário internacional em diversas partes do mundo, inclusive o Brasil.
O apoio da sociedade garantiu, há cerca de 20 anos, a resistência da BBC às investidas conservadoras do governo Margaret Thatcher (1979-1990). Esse mesmo apoio estará em jogo em 2006, quando o atual governo trabalhista aproveitará a revisão periódica da carta da emissora para tentar pulveriza-la.
A força da BBC atraiu a oposição oficial. A fragilidade da TV Cultura atraiu a intervenção branca do governo do Estado.
O caso inglês pode ser acompanhado através de mecanismos abertos de consulta e informação. Recomendo aos interessados uma visita ao site da BBC (www.bbc.co.uk), para um panorama impressionantemente aberto da companhia, seus organismos, dirigentes, planos e avaliações.
Já no caso da TV Cultura, se não houver uma estrutura que garanta autonomia financeira e controle da sociedade, ela nunca deixará de ser governamental.


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP


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