|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Os fantasmas se divertem
Festa em SP resgata músicos como Ritchie, Kid Vinil e Leoni e consolida o revival dos anos 80
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
Os anos 80 chegaram há 20 anos. Os anos 80 chegaram há
dois anos. Os anos 80 chegam
amanhã.
Bandas de sucesso na década de
80 como Legião Urbana, Titãs,
Paralamas do Sucesso, Engenheiros do Hawaii, Barão Vermelho e
Capital Inicial comeram grande
parte do bolo e se lambuzaram
pelos anos 90. Mas gente como
Leo Jaime, Ritchie, Leoni, Kid Vinil e Roger Moreira foi desconvidada da festa após degustar algumas fatias. Agora, eles vieram
buscar as partes que lhes cabiam.
Já ouvidas e celebradas em cidades como Fortaleza, Rio Branco
(AC) e Rio de Janeiro, hits pegajosos como "Inútil", "Gatinha Manhosa", "Fixação" e "Menina Veneno" serão entoados neste sábado, no DirecTV Music Hall -o então Palace "naquela época"-,
durante a "Festa Geração 80".
O evento é mais um -e um dos
maiores- tentáculos de uma já
estabelecida "indústria dos anos
80". É uma indústria que iniciou
como reciclagem e agora se auto-recicla. Há pouco mais de dois
anos, Gang of Four e Duran Duran voltaram à moda, por meio de
bandas como Rapture e Fischerspooner. Grupos até então afastados do mundo pop, hoje Gang of
Four e Duran Duran excursionam pela Inglaterra.
O Brasil entrou na onda. Livros
sobre a década foram lançados (o
mais proeminente, "Quem Tem
um Sonho Não Dança", de Guilherme Bryan), festas foram criadas (em São Paulo, a Trash 80's lota nas quatro noites semanais) e
carreiras foram ressuscitadas.
Leo Jaime, por exemplo. O autor de "Sete Vampiras" e "Nada
Mudou", que nos anos 80 chegou
a gravar seis discos, passou os 90
esquecido e lançou apenas um:
"Todo Amor". No ano passado, a
reviravolta. Criou um blog
(http://leojaime.blog.uol.com.br/) que recebe mais de 20 mil visitas mensais, virou celebridade
no Orkut (fez mil amigos em menos de dois meses) e dividiu vocais com Ian McCulloch (do Echo
& the Bunnymen). Neste 2005, fará mais de 200 shows pelo país.
"Tudo isso sem apoio nenhum,
sem dinheiro. Sou punk, independente, marginal, underground", afirma o cantor de 44
anos. "Minha vida é mais gostosa
hoje do que naquela época."
O show de SP serve como uma
alavanca para um circuito mais
consistente para essa turma.
"Claro, tenho dificuldade de
vender um show apenas meu,
mas essa reunião é um sucesso,
lotamos todas as apresentações",
diz o inglês Ritchie. "Ouço falar
desse revival desde que os anos 80
acabaram. É que agora isso é chique. Não é apenas nostalgia de
quarentões. Muitos jovens, que
não eram crescidos naquela época, gostam da gente, nos idolatram. E artista quer isso. No fundo, somos todos carentes."
Se há alguém que sofreu com o
choque da virada dos anos 90, esse alguém é Ritchie. Hoje com 52
anos, em 1983 ele protagonizou
um dos maiores fenômenos da
música brasileira em todos os
tempos. Sua "Menina Veneno"
estourou nas rádios do país inteiro e impulsionou a vendagem do
disco "Vôo de Coração" para
além do até então insuperável Roberto Carlos -o LP vendeu 1,2
milhão de cópias.
"Era uma histeria", lembra. "No
interior de São Paulo, teve uma
vez que uma multidão de adolescentes virou meu carro de cabeça
para baixo." Mas durou pouco.
A CBS (hoje Sony) passou a
"vender" Ritchie como cantor romântico, espécie de Guilherme
Arantes. Em retrospecto, nem ele
nem os fãs concordaram. "Fui
tarjado de cantor brega por uns e
de artista sofisticado por outros."
Após alguns discos de impacto
menor, desistiu da carreira. "Fui
morar na Califórnia para trabalhar com sonorização de sites,
com Thomas Dolby [artista britânico]." Em 2002, voltou a lançar
disco de inéditas, "Auto-Fidelidade". "Mas não tenho mágoas nem
me considero perseguido."
Além de Ritchie e Leo Jaime, a
turnê "Festa Geração 80" é completada por Kid "Eu Sou Boy" Vinil, líder do antigo Magazine, e
pelo baixista Leoni, ex-Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens.
Nesta edição paulista, entra Roger Moreira, do Ultraje a Rigor. O
ex-Blitz Evandro Mesquita completa o line-up em participação
especial. O grupo deve tocar, separadamente, hits de suas carreiras; juntos, hits de outras carreiras, como "Geração Coca-Cola"
(Legião Urbana) e "Pro Dia Nascer Feliz" (Barão Vermelho).
"Encaro isso como uma forma
de mostrar a um público jovem
coisas bacanas de uma certa época. Não tem a pecha de saudosismo", afirma Roger, 48. "É um negócio rentável, sim, mas como
nos EUA. Lá se valoriza a produção do passado. Se você for numa
loja, vai encontrar o primeiro disco do Bob Dylan. Aqui, se procurar o "Acabou Chorare" dos Novos
Baianos, não encontra."
Mas o que deu errado? Para Leo
Jaime, o bom humor de sua turma passou a ser malvisto. "A crítica da época começou a reagir contra. Eram viúvas do Nick Cave
[cantor australiano], que achavam que artista tinha que ser deprimido, sofisticado. E isso influenciou as gravadoras. Tudo o
que tínhamos, aquela coisa popular, democrática, bem-humorada,
passou a ser vista como brega. E
eu fiquei sem saber o que fazer."
Continua: "Em 1990, lancei um
disco. Mas, com o Plano Collor, as
gravadoras não tinham dinheiro e
tiveram que optar por quem
iriam divulgar. Aí eu percebi que
os anos 80 tinham acabado." Mas,
hoje, não é bem assim.
Festa Geração 80
Onde: DirecTV (av. Jamaris, 213, SP, tel.
0/xx/11/6846-6040)
Quando: amanhã, a partir das 22h
Quanto: de R$ 50 a R$ 100.
Texto Anterior: Programação de TV Próximo Texto: Os fantasmas se divertem: Chega de retrô; nós odiamos os anos 80 Índice
|