São Paulo, sexta-feira, 25 de fevereiro de 2005

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OSCAR

Artistas criticam decisão da Academia de escolher Antonio Banderas para interpretar a canção do uruguaio Jorge Drexler

Veto a músico de "Diários" estimula carta-protesto

SÉRGIO DÁVILA
DA CALIFÓRNIA

O produtor que dirigirá a transmissão televisiva do Oscar neste domingo vetou o nome do uruguaio Jorge Drexler para cantar sua própria obra, "Al Otro Lado del Río", como é praxe na cerimônia. A música do filme "Diários de Motocicleta", dirigido pelo brasileiro Walter Salles, concorre a melhor canção original. Segundo a Folha apurou, o veto irritou os envolvidos no filme e personalidades do meio cultural latino-americano, que divulgariam uma carta-protesto na noite de ontem.
Há pouco mais de uma semana, o produtor norte-americano Gil Cates anunciou que o cantor pop espanhol Enrique Iglesias cantaria a música acompanhado do guitarrista mexicano Carlos Santana, mas logo voltou atrás diante da reação do público no Uruguai, Argentina e Espanha e do próprio Drexler, que ameaçou retirar a canção da competição -decisão que ganha mais peso quando se leva em conta que a sua é a primeira canção em espanhol a concorrer ao Oscar em 77 anos.
A Folha apurou que, depois de Iglesias, Cates convidou o casal de cantores-atores Marc Anthony e Jennifer Lopez, que recusaram por conflito de agenda. O produtor chegou então a um nome de consenso, Antonio Banderas, que deve cantar "Al Otro Lado del Río" no domingo acompanhado de Santana. O ator só aceitou o convite depois de consultar Drexler, que deu sinal verde para o espanhol. Banderas talvez fale ao vivo que quem deveria estar no palco era o próprio autor, não ele.
Além disso, em sinal de protesto, o mexicano Gael García Bernal recusou o convite de introduzir o momento em que a canção vai ser mostrada na cerimônia. O ator interpreta Che Guevara em "Diários de Motocicleta", e é praxe que um dos atores do filme faça isso. Ainda não foi anunciado quem introduzirá "Al Otro Lado del Río", mas as atrizes Penélope Cruz, espanhola, e Salma Hayek, mexicana, já confirmaram presença.
A carta-protesto deve ter assinaturas de, entre outros, os diretores mexicanos Alejandro González Iñárritu e Alfonso Cuarón. "Gostaríamos de expressar nossa insatisfação com o que parece ser eticamente inaceitável para nós", diz rascunho da carta. "A decisão que nos está sendo imposta não é somente desrespeitosa com o artista como autor. Também demonstra um completo desinteresse pelas diversas matizes culturais que existem em nosso continente."
O autor do imbróglio não é a Academia, que afinal indicou uma música cantada em espanhol pela primeira vez na história, mas Cates, 70, um diretor de filmes B e produtor-executivo em sua 12ª direção não-consecutiva da cerimônia, que foi chamado de volta para tentar aumentar a audiência da premiação, em queda livre. Foi sua idéia, por exemplo, convidar o comediante negro Chris Rock para apresentar a festa deste ano. Indagado sobre as mudanças, disse: "Preocupo-me apenas com a audiência, que quer ver astros".
A "limpeza étnica" atingiu outras pessoas. A inglesa Minnie Driver, inicialmente escalada para defender a música que canta em "O Fantasma da Ópera", "Learn to Be Lonely", sofreu veto semelhante. Por decisão de Cates, a atriz foi substituída pela cantora negra Beyoncé Knowles. A mesma Beyoncé, uma das maiores vendedoras de disco para o mercado pop, também destronou o coro de meninos franceses que originalmente canta "Vois Sur Ton Chemin" em "A Voz do Coração" -no domingo, os pequenos gauleses serão substituídos pelo American Boychoir, que cantará com ela a versão em inglês "Look to Your Path".
"Gostaria de ter sido comunicado de que não cantaria ou pelo menos consultado pela produção sobre a decisão, o que nunca aconteceu", disse à Folha Jorge Drexler. Para Walter Salles, a decisão "desrespeita o autor, tem um caráter impositivo e mostra desinteresse ou, pior, ignorância em relação à diversidade cultural que existe na América do Sul".
Mas o diretor contrapõe isso com os mais de 40 prêmios e indicações do filme -"Diários" concorre ainda ao César no sábado: "Estamos felizes, tivemos o prêmio da crítica londrina, os dois prêmios no Bafta, o Goya para o roteirista José Rivera. E, mais importante, "Diários" chega aos 10 milhões de espectadores, mais do que poderíamos esperar".


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