São Paulo, quinta-feira, 25 de março de 2004

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CRÍTICA

Montagens honram o slogan "intenso como a vida"

SERGIO SALVIA COELHO
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Intensa e delicada como uma paixão que já começa trêmula em pensar que um dia deverá terminar é "Coisas Invisíveis", da Cia. Clara, de Belo Horizonte.
Em um palco nu, Ana Vida, Henrique Meirelles (que em 2003 já tinham vindo a Curitiba com um "Vereda da Salvação" marcante), Grace Passô e Gustavo Bones compartilham com a platéia trama de pequenas epifanias.
Otto, paixão de duas pessoas da turma, morre atropelado: seus amigos devem continuar a viver normalmente, "como uma homenagem", mas revendo suas vidas. O texto de Gustavo Naves Franco tem uma poesia de palavras cotidianas, com um tom confessional que os atores, guiados com suavidade e precisão por Anderson Aníbal, sabem tingir de silêncio e intensidade, evitando o piegas.
Na outra ponta desse espectro solar está o monólogo "Licurgo - Olhos de Cão", do paulistano Celso Alves Cruz. É o mesmo despojamento de um cenário mínimo tornado mágico por luz precisa, mas a poesia de Cruz, que ultrapassa o cotidiano com uma tragédia de excessos que se apropria do trash sem cair no mau gosto, pede ator mais maduro.
Marcos Suchara faz um professor que encarna a loucura de Licurgo, o legislador grego condenado a matar o filho por ter menosprezado Dioníso. Impressiona ver como Suchara deixa a dor interna o devorar aos poucos, expondo o fato consumado que se percebe cada vez mais terrível, sem perder a verossimilhança.
Da dor cotidiana ao excesso trágico, tendo o teatro por instrumento, e honrando o slogan "intenso como a vida" deste 13º festival, ambas as montagens tornam visível a luta cotidiana por preencher a solidão do mundo. Dioníso, e o público, agradecem.


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