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Diretor mostra um IRA romântico e explosivo
LEON CAKOFF
especial para a Folha
Mesmo dizendo ter perdido muitas noites de sono diante do desafio de filmar a vida do herói irlandês Michael Collins (1890-1922), o
também irlandês Neil Jordan conseguiu tornar o tema delicado do
seu novo filme num épico fácil de
assistir.
Mais fácil ainda é não errar o lado da torcida na hora da definição
dos vilões da história.
Neil Jordan parece não ter dificuldades em lidar com evidências
históricas. Não há constrangimentos ou reservas para se mostrar o
IRA (Exército Republicano Irlandês) em sua origem romântica e,
ao mesmo tempo, explosiva.
É fascinante acompanhar a luta
de Michael Collins, desde 1916, pela libertação da Irlanda do domínio britânico.
O que vemos é mais do que uma
sintética aula de história contemporânea. É inevitável atribuir ao
IRA o pioneirismo em uma técnica
de sublevação, terrorismo, guerrilha urbana e sabotagens que depois se espalharam pelo mundo
-da China de Mao à América Latina de Che Guevara.
Com atrocidades dos dois lados,
as sabotagens do IRA desestabilizaram a reação britânica depois de
sete séculos de colonização.
Torcida
Diante da ordem das evidências
que o filme apresenta, torna-se
inevitável torcer pelo IRA. As evidências históricas juntadas para
``Michael Collins'' definem os vilões a serem execrados pelo resto
da narrativa: os ingleses.
Com comoção e espanto, vemos
a ação do IRA ser envolvida pelos
princípios que ativam a formação
de um partido político. Partido
que começa nos trabalhos de base
e atinge as traições palacianas.
Como em qualquer retrospecto
político, românticos como Collins
serão lembrados por sua cega obstinação. Ou o que se chamaria hoje
de trabalhos de base.
Collins cuidava da seleção de jovens voluntários para as suas armadas, inclusive os ``squads'', responsáveis pela execução de agentes britânicos pertencentes a uma
temível tropa de elite conhecida
como ``Gangue de Cairo''.
A resposta a uma ação desencadeada em 1920 foi o massacre aleatório de 14 torcedores de futebol
num estádio de Dublin. A reconstituição do episódio conhecido por
``Bloody Sunday'' é memorável no
filme de Jordan.
As concessões do diretor ficam
no campo da narrativa, com a dramaticidade resumida ao sabor da
síntese histórica. Um agente duplo
chamado Ned Broy morre torturado no filme. Ele, fora da ficção, sobreviveu aos massacres daquele
domingo sangrento.
Morre no filme para provocar
mais comoção, Jordan, contudo,
apaga da narrativa o sacrifício real
de dois colaboradores de Collins
-Dick McKee e Peadar Clancy,
estes sim torturados até a morte.
Personalidade
A personalidade de Collins também dança ao sabor da fantasia cinematográfica. É verdade, como o
filme mostra, que a repressão britânica nunca conseguiu capturá-lo. Faltava uma boa foto dele
em seus arquivos. Mas a sua vida
misteriosa é decantada em detalhes reveladores e duvidosos.
Julia Roberts desfila a sua serena
insegurança dividida entre os
amores de Collins e de um de seus
principais auxiliares.
E o filme termina por sugerir que
a inclinação final da mulher por
Collins foi um dos motivos que
provocaram o racha partidário
que levou à sua morte e jogou a jovem república irlandesa numa
guerra civil.
Pior é o papel maquiavélico reservado a Eamon de Valera, que
aparece como uma sombra ambiciosa de teatro shakespeariano, capaz de tudo para não se queimar
antes do tempo. Este personagem
real sobreviveu e terminou presidente da Irlanda.
Com ele aprendemos que a política fica por conta de quem não sabe fazer outra coisa.
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