São Paulo, sexta-feira, 25 de maio de 2001

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CINEMA/ESTRÉIA

"TRÊS IRMÃS"

Personagens que conversam com espectador e narrador onisciente permeiam filme de Danielle Thompson

Câmeras desvelam intimidade da família

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Há 30 anos, discutia-se febrilmente o conceito do narrador onisciente, que maneja os personagens como um deus.
Há 30 anos, Danielle Thompson estava iniciando uma carreira triunfal de roteirista, com sucessos como "As Aventuras do Rabi Jacó" e "Primo Prima".
Thompson estreou na direção em 99 - sem abandonar a condição de roteirista- com "Três Irmãs", que narra a festa de Natal de uma família moderna.
Moderna, isto é: o segundo marido da mãe acaba de morrer; a filha mais velha (Sabine Azéma) está grávida de um homem casado, a do meio (Emmanuelle Béart) mantém as aparências, mas está a ponto de se separar do marido, e a menor (Charlotte Gainsbourg) hostiliza a mãe e a irmã do meio e adora o pai.
A proposta não é tão original, mas está longe de ser detestável: famílias são feitas de separações e encontros. O Natal ajuda a promover aproximações hipócritas ou sinceras e aparar arestas (ou revelar a dimensão do abismo).
Na tradição americana, as coisas costumam ir para uma direção única. Já na francesa, a cerimônia grupal, ao mesmo tempo, a desagrega.
Organizar as coisas nessa direção pode não ser fácil. E Thompson opta pelo caminho mais fácil: o do narrador onisciente. Ela conhece o íntimo dos personagens, leva-os para cá e para lá, os faz até dialogar com a câmera.
Assim, pode-se compreender por que boa parte do público francês rejeita a nouvelle vague. Em qualquer um de seus autores (Rivette, Godard etc.), o humano é ambíguo, comporta mistérios, zonas inexploráveis. Em "Três Irmãs" conhece-se tudo de todos.
À força de "estar dentro" de cada personagem de maneira escrupulosa, Thompson cria uma espécie de realismo irrealista. E à força de se mostrarem transparentes ao espectador, esses personagens acabam por virar excessivamente pessoais. As circunstâncias tornam-se um absoluto, e o fenômeno geral em que o filme quer tocar (a destruição da família tradicional e sua reorganização em novos termos) acaba um tanto diluído.


Três Irmãs
La Büche
  
Direção: Danielle Thompson
Produção: França, 1999
Com: Emmanuelle Béart, Charlotte Gainsbourg, Sabine Azéma, Claude Rich
Quando: a partir de hoje no Top Cine




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