São Paulo, segunda, 25 de maio de 1998

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Palma para Angelopoulos

France Press
Theo Angelopoulos vencedor da Palma de Ouro do 51º Festival Internacional de Cannes com 'Mia Eoniotita Ke Mia Mera'



O diretor grego recebe a Palma de Ouro por "A Eternidade e um Dia"; Grande Prêmio vai para o italiano Roberto Benigni, por "A Vida É Bela"


AMIR LABAKI

enviado especial a Cannes

Afinal chegou a hora de Theo Angelopoulos: em sua quinta tentativa, o cineasta grego conquistou ontem com "Mia Eoniotita Ke Mia Mera" (A Eternidade e um Dia) a Palma de Ouro do 51º Festival Internacional de Cannes. Sisuso, lembrou a reclamação que fez há três anos ao perdê-la com "Um Olhar a Cada Dia" para "Underground", de Emir Kusturica. Foi sintético: "Meu Deus, não tenho palavras", começou dizendo. Deu o puxão de orelhas no festival e encerrou com um "obrigado". O contraste não poderia ser maior com o show protagonizado minutos antes pelo cineasta italiano Roberto Benigni. Vencedor do Grande Prêmio com "La Vita È Bella" (A Vida É Bela), Benigni subiu ao palco eufórico, confundiu-se todo agradecendo ("Obrigado pela Palma de Ouro"), atirou-se aos pés do presidente do júri, Martin Scorsese, e fez questão de beijar os jurados um a um. Eram prêmios esperados, assim como a maioria dos que os precederam. "Mia Eoniotita Ke Mia Mera" é um sensível drama sobre o encontro de um escritor à beira da morte (Bruno Ganz) e um garoto de rua exilado da Albânia (Achileas Skevis). Não renova a filmografia de Angelopoulos, tradicionalmente dedicada ao resgate da memória, mas deve expandir seu público, devido à maior fluência narrativa. "La Vita È Bella" nem precisaria do prêmio para conquistar espectadores do mundo todo. Benigni dirigiu e protagonizou o que define como "um filme de um comediante sobre o Shoah (Holocausto)". Esse legítimo herdeiro de "O Grande Ditador", de Chaplin, é um fenômeno de bilheteria na Itália. Cannes apenas lhe adiciona agora um carimbo de autoridade estética.
As jovens francesas Elodie Bouchez e Natasha Regnier eram as favoritas como a dupla de jovens solitárias de temperamento oposto em "La Vie Rêvée des Anges" (A Vida Onírica dos Anjos), do estreante Erick Zonca. De saia escocesa, Peter Mullan só poderia mesmo dividir com o diretor Ken Loach o prêmio de melhor ator por "My Name is Joe" (Meu Nome é Joe).
A polêmica instaura-se daí para baixo. "The General" (O General), sobre o principal ladrão irlandês dos anos 90, é o melhor filme recente de John Boorman. Há um exagero e tanto em atribuir-lhe o prêmio de direção, repetindo o que já acontecera com ele há 28 anos por "Príncipe sem Palácio".
"Henry Fool" é o mais fraco dos filmes de Hal Hartley e parte do problema é a ambição desmesurada da segunda parte do roteiro. Não há justificativa para premiá-lo.
O Prêmio do Júri foi concedido a dois filmes que tratam da violência sexual contra crianças: "La Classe de Neige" (A Aula de Esqui), de Claude Miller, e "Festen" (Festa de Família), de Thomas Vinterberg. Um é clássico, o outro, inquieto e ousado. Parece mais um reconhecimento à coragem de abordar o tema do que um julgamento apenas cinematográfico.
A maior ousadia foi a concessão "extra" de um prêmio de melhor contribuição artística a "Velvet Goldmine", de Todd Haynes. Foi o justo reconhecimento ao mais experimental dos títulos da competição, sem embargo da irregularidade.
Por sua vez, o júri de curtas não resistiu a uma patriotada. O francês "L'Interview", de Xavier Giannoli, é uma reconstituição não mais que simpática de uma entrevista de um repórter com Ava Gardner, pouco antes da morte da atriz de "A Condessa Descalça".
Os dois curtas mais criativos acabaram dividindo o Prêmio do Júri: "Horseshoe", de David Lodge, e "Gasman", de Lynne Ramsay. Três dos cinco jurados de curtas eram franceses, incluindo o presidente, Jean-Pierre Jeunet ("Delicatessen"). Dá nisso.



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